Pular para o conteúdo principal

Belos Sonhos (2016) | Memória e nostalgia

Fai Bei Sogni (Itália)
O filme de abertura da 40ª Mostra Internacional de Cinema é Belos Sonhos, dirigido pelo italiano Marco Bellocchio, homenageado do ano, ao lado de William Friedkin. Mesmo tratando-se de uma adaptação, o diretor retoma os temas constantes em sua filmografia: família, memória e amadurecimento.

A história segue a trajetória de Massimo da infância até a vida adulta, tendo como principal plano de fundo a relação do garoto com sua mãe, que morreu misteriosamente quando ele tinha 9 anos. Após isso, ele foi obrigado a viver somente com seu pai, em uma relação distante e fria. Com a notícia de que sua antiga casa será vendida, Massimo volta à sua infância, agora adulto, dividindo seu tempo entre o trabalho como vice-diretor de um jornal e a busca por respostas de seu passado. A história é contada de forma fragmentada, e a direção de Bellocchio é precisa, conduzindo o espectador com primazia através da temporalidade do filme. Por mais que seja um filme lento, o espectador é preso pela narrativa do diretor em uma relação quase intimista com Massimo.

A estética do filme transita entre os anos 60 e 90 em um compasso cauteloso e exato. Bellocchio domina a complexidade de uma direção entre gerações de maneira fluida; o filme proporciona imersões temporais na nostalgia de Massimo, onde somos cúmplices das novas descobertas do escritor sobre seu passado e, além disso, da sua relação com seus pais. 'Belos Sonhos' é um filme sobre como a autodescoberta está associada com a relação entre o sujeito e seu passado. À medida que Massimo relembra momentos e passa a entender situações passadas, seu futuro se transforma. 

Bellocchio constrói o filme de forma que cada cena seja intrínseca à trama. A fragilidade do protagonista, em sua fase adulta, é refletida em seus relacionamentos, sempre vazios e, além disso, dotados da incompletude pertencente à Massimo. Em uma questão quase edípica, o seu ser-pleno só será legitimado após os conflitos maternos remanescentes serem solucionados.

Belos Sonhos é um filme maduro, que demanda do espectador imersão na narrativa e proporciona reflexões sobre a subjetividade e o passado. A identificação é quase imediata, e as pouco mais de 2 horas de duração parecem minutos perante ao que é colocado em tela. É um ótimo início de 40ª Mostra, que vai até o dia 2 de novembro em diversos cinemas da capital paulista. 




Filme assistido na 40ª Mostra Internacional de Cinema

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Sacrifício do Cervo Sagrado (2017): com divina retribuição, Ele virá para salvá-los

Com uma atmosfera que remete a Iluminado , com seus travelings com O Único Plano de Fuga de Stanley Kubrick , planos captados com uma lente que lembra uma visão extracorpórea da rotina do bem-sucedido cardiologista Steve ( Colin Farrel ), O Sacrifício do Cervo Sagrado tenta atrair sua atenção neste mês de fevereiro.  O Sacrifício do Cervo Sagrado (2017)  Com divina retribuição, Ele virá para salvá-los A história acompanha o personagem de Farrel, que mantêm contato frequente com Martin ( Barry Keoghan ), que perdeu o pai na mesa de operação na qual Steve trabalhava. Quando Martin começa a não obter a atenção desejada pelo cirurgião, coisas estranhas começam a acontecer a seus filhos. Ao acompanhar a família do médico e suas relações intrínsecas, sentimos que cada plano carrega uma estranheza suspensa e crescente pelo uso do zoom; ele te intima a mergulhar em cada diálogo na mesa de jantar, em cada andança sem pretensões pela ala de um hospital ansiando por achar o erro na imag

Homem de Ferro (2008) | O grande primeiro passo da Marvel Studios

Robert Downey Jr. sempre foi um ator talentoso, diferentemente do que muitos apontam. Apesar de seus encontros com a polícia em função das drogas, o astro sobreviveu a um intenso mergulho na dependência química e conseguiu dar a volta por cima naquele que, o próprio diretor Jon Favreau julga como um filme independente do gênero de super-herói. Sem contar com o modelo físico e com o caráter que o justificaria ao posto de protagonista, Tony Stark foi um acerto nos cinemas tão corajoso e sagaz quanto os quadrinhos do herói, criados lá em 1963 por Jack Kirby e Stan Lee . Na trama, o diretor Favreau narra o surgimento do universo Marvel a partir de um violento incidente na vida do bilionário Tony Stark, que, durante uma viagem ao Afeganistão (substituindo o Vietnã dos quadrinhos) para apresentar um novo armamento aos militares, é sequestrado por terroristas locais. Forçado a construir sua nova invenção sob pena de ser morto, Stark cria uma poderosa armadura para se libertar da cav

Paratodos (2016) | documentário necessário e inspirador

Paratodos (Brasil) À primeira vista, o documentário "Paratodos" (2016), dirigido por Marcelo Mesquita , pode parecer um daqueles especiais televisivos onde indivíduos com deficiências físicas contam suas histórias de superação. No entanto, ainda em seus primeiros minutos, percebemos a grande ambição do filme que, dividido em atos, um para cada modalidade esportiva, apresenta bem mais do que atletas paralímpicos vencendo dificuldades.  Rodado desde 2013, o documentário que, além do Brasil, traz cenas gravadas em outros países, esforça-se para sair do comum e apresenta seus personagens de forma a valorizar não só suas conquistas, mas revelar os estressantes bastidores de treinos e a rotina dos competidores paralímpicos, que muitas vezes é ainda mais complicada do que a de atletas regulares. A proposta é bastante importante para elevar a visibilidade destes atletas em nosso País, principalmente às vésperas de Olimpíadas, visto que seus feitos costumam ser bastante