Pular para o conteúdo principal

Cannes 2017: Werner Herzog e os tempos de Brasil em Cannes

Resultado de imagem para terra em transe glauber
Anselmo Duarte segura a
Palma de Ouro em 1962
É instigante lembrar que entre 1949 e 1971, a presença do cinema brasileiro em Cannes era rotina. Poucos foram os intervalos nesses 22 anos em que a grande premiação francesa ficou sem um representante do país. Era um fluxo tão intenso que acontecia de dois filmes concorrerem no mesmo ano (1954, 1964 e 1970). Dois dos pilares do nosso cinema "Deus e o Diabo na Terra do Sol", de Glauber Rocha, e "Vidas Secas", de Nelson Pereira dos Santos competiram juntos pouco depois de trazermos a Palma de Ouro de "O Pagador de Promessas", de Anselmo Duarte

O 'Cinema Novo' surgiu em um momento de "renovação" dos agrupamentos culturais; respirando o ar de outros movimentos, consolidou-se "rapidamente" como também influência para o cinema que se fez posteriormente. A chamada "Nova Hollywood" começou a ser discutida por esses tempos, numa geração representada por nomes como Coppola, de Palma, Scosese, Spielberg, e todos eles reconheciam o Cinema Novo. Scorsese, por exemplo, é um dos teóricos do movimento e sempre reconheceu Glauber em sua influência pessoal. 

O alemão Werner Herzog também fazia parte desse grupo de jovens cineastas que, nesse período, faziam curtas-metragens, documentários televisivos, mini-séries, etc, e que não só viu, como sentiu o acontecimento. Em um tempo não tão distante, a redução da comunicação instantânea induzia esse envolvimento imediato com qualquer que fosse o burburinho mundial; ainda mais um burburinho como o Cinema Novo. Esse ano (2017), Herzog esteve presente em Cannes para receber uma homenagem na Quinzena dos Realizadores - seção paralela do Festival. Em um dos pontos do seu discurso, lembrou-se com emoção desse passado que também o formou como cineasta. 

"Houve um tempo em que sempre tinha Brasil aqui", disse Herzog lembrando logo em seguida de cineastas com quem filmou: Glauber Rocha e Ruy Guerra. Inclusive, um momento curioso logo em seguida a fala. Para a platéia francesa, uma tradutora estava de pé ao seu lado convertendo a fala em tempo real, mas tropeçou nos nomes dos diretores; pediu que repetisse. Herzog disse novamente enquanto a plateia abria um riso rápido. 

Glauber marcou presença três vezes no festival em menos de 10 anos, e isso diz muito sobre o momento em que o cinema (mundial e brasileiro) vivia, e causa uma reflexão imediata sobre o que se passou. Nada relacionado estritamente ao duvidoso glamour de Cannes, mas ao fato de sermos também influência em um processo de globalização que nos torna cada vez mais espelho de culturas externas. Ainda não é possível definir o que é o cinema brasileiro, muito menos o que chamamos de “cinema contemporâneo”, mas não é preciso esperar um novo grande movimento para isso. É preciso lembrar essencialmente que Cannes (entenda ‘Cannes’ como um dos símbolos de reconhecimento mundial) é só uma resposta do que já reconhecemos internamente – e não o contrário. 

De 70 para cá, embora tenha diminuído o ritmo, a frequência ainda é interessante. Das sete participações desde 2000, três são de Walter Salles (entre produções e coproduções), inclusive com anos também seguidos. Foi bom Herzog lembrar que Glauber Rocha, Ruy Guerra, que o Cinema Brasileiro faz parte dos 70 anos que Cannes comemora em 2017 – e também é bom lembrar que continua fazendo.

Cannes 2017: Werner Herzog e os tempos de Brasil em Cannes

Em homenagem, o diretor alemão lembrou do cinema brasileiro


Resultado de imagem para glauber rocha cannes
Equipe de "Aquarius" em protesto no 69º Festival de Cannes

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Sacrifício do Cervo Sagrado (2017): com divina retribuição, Ele virá para salvá-los

Com uma atmosfera que remete a Iluminado , com seus travelings com O Único Plano de Fuga de Stanley Kubrick , planos captados com uma lente que lembra uma visão extracorpórea da rotina do bem-sucedido cardiologista Steve ( Colin Farrel ), O Sacrifício do Cervo Sagrado tenta atrair sua atenção neste mês de fevereiro.  O Sacrifício do Cervo Sagrado (2017)  Com divina retribuição, Ele virá para salvá-los A história acompanha o personagem de Farrel, que mantêm contato frequente com Martin ( Barry Keoghan ), que perdeu o pai na mesa de operação na qual Steve trabalhava. Quando Martin começa a não obter a atenção desejada pelo cirurgião, coisas estranhas começam a acontecer a seus filhos. Ao acompanhar a família do médico e suas relações intrínsecas, sentimos que cada plano carrega uma estranheza suspensa e crescente pelo uso do zoom; ele te intima a mergulhar em cada diálogo na mesa de jantar, em cada andança sem pretensões pela ala de um hospital ansiando por achar o erro na imag

Homem de Ferro (2008) | O grande primeiro passo da Marvel Studios

Robert Downey Jr. sempre foi um ator talentoso, diferentemente do que muitos apontam. Apesar de seus encontros com a polícia em função das drogas, o astro sobreviveu a um intenso mergulho na dependência química e conseguiu dar a volta por cima naquele que, o próprio diretor Jon Favreau julga como um filme independente do gênero de super-herói. Sem contar com o modelo físico e com o caráter que o justificaria ao posto de protagonista, Tony Stark foi um acerto nos cinemas tão corajoso e sagaz quanto os quadrinhos do herói, criados lá em 1963 por Jack Kirby e Stan Lee . Na trama, o diretor Favreau narra o surgimento do universo Marvel a partir de um violento incidente na vida do bilionário Tony Stark, que, durante uma viagem ao Afeganistão (substituindo o Vietnã dos quadrinhos) para apresentar um novo armamento aos militares, é sequestrado por terroristas locais. Forçado a construir sua nova invenção sob pena de ser morto, Stark cria uma poderosa armadura para se libertar da cav

Paratodos (2016) | documentário necessário e inspirador

Paratodos (Brasil) À primeira vista, o documentário "Paratodos" (2016), dirigido por Marcelo Mesquita , pode parecer um daqueles especiais televisivos onde indivíduos com deficiências físicas contam suas histórias de superação. No entanto, ainda em seus primeiros minutos, percebemos a grande ambição do filme que, dividido em atos, um para cada modalidade esportiva, apresenta bem mais do que atletas paralímpicos vencendo dificuldades.  Rodado desde 2013, o documentário que, além do Brasil, traz cenas gravadas em outros países, esforça-se para sair do comum e apresenta seus personagens de forma a valorizar não só suas conquistas, mas revelar os estressantes bastidores de treinos e a rotina dos competidores paralímpicos, que muitas vezes é ainda mais complicada do que a de atletas regulares. A proposta é bastante importante para elevar a visibilidade destes atletas em nosso País, principalmente às vésperas de Olimpíadas, visto que seus feitos costumam ser bastante