Pular para o conteúdo principal

A Torre Negra (2017) | Superficial disfarçado de complexo

Resultado de imagem para torre negra filme
Resultado de imagem para torre negra filme poster
The Dark Tower (EUA)
Um western com toques de ficção científica, fantasia e terror: se até mesmo classificar A Torre Negra, obra do escritor Stephen King, em um gênero literário é um trabalho difícil, levar a saga para as grandes telas sempre se mostrou tarefa ainda mais complicada. Depois de muitas tentativas de tornar o filme uma realidade, com o projeto sendo constantemente engavetado apenas para ser reativado de novo, o longa finalmente chegou nas mãos da Sony e do diretor dinamarquês Nikolaj Arcel, também co-autor do roteiro. 

Entretanto, a complexa trama dos oito livros da saga é muito mais simplista em sua adaptação audiovisual, com apenas 95 minutos de exibição. Diante da ameaça do Homem de Preto (Matthew McConaughey) de destruir a Torre Negra, estrutura responsável por manter a existência de todos os mundos, cabe a Roland Deschain (Idris Elba) cumprir seu papel como pistoleiro e intervir nos planos do mago, evitando o colapso total do universo, ao mesmo tempo em que deve proteger Jake Chambers (Tom Taylor), um garoto de Nova York com visões sobre o mundo de Roland.

Apesar da sinopse indicar estarmos diante de uma obra com elementos mitológicos capazes de render um universo envolvente, o maniqueísmo do roteiro torna esse um filme básico, superficial e uma tentativa falha de retratar os arquétipos narrativos mais primordiais da humanidade. Ainda que tente esconder a mediocridade por trás de sentimentos expositivos de vingança e falta de pertencimento, essa é puramente a história de um herói contra um vilão cujo objetivo é simplesmente destruir o universo, sem que isso precise de qualquer lógica ou fundamento: o clássico (e ultrapassado) bem contra o mal. E nada mais.

Quase tão bobos quanto a própria premissa do roteiro estão os furos e conveniências recorrentes, desde o encontro casual entre personagens, até o vilão, dotado de habilidades que o tornam apto a matar apenas com uma palavra (Kilgrave?), mas incapaz de exercer influência sobre o pistoleiro com sua mágica, por nenhum motivo aparente. O mesmo vilão que se dá ao trabalho de viajar entre mundos em busca de pistas sobre algo, mas envia seus capangas para resgatar aquilo que procura, simplesmente para o filme ganhar uma cena de batalha onde o herói possa mostrar suas habilidades com os revólveres.

Mesmo com ingredientes que sugerem grandiosidade, nada aqui é concreto, sobretudo para quem não está familiarizado com o universo de King. Sim, sabemos que a Torre mantém os mundos seguros, mas não sabemos onde ela está e nem por que é possível destruí-la com a mente de uma criança (algo dito nos letreiros iniciais). Também sabemos que os pistoleiros estão extintos, mas nunca entendemos a real importância desses guerreiros. Assim como só podemos imaginar os seres e ambientes presentes no mundo de Roland, pois nada é mostrado além de restos de tecnologia deixados por povos mais antigos.

Entretanto, ainda que todas essas lacunas fossem preenchidas caso o longa tivesse meia hora a mais de duração, continuariam sendo inevitáveis os risos causados pelo último confronto entre os personagens, desrespeitoso a qualquer lei da física, mesmo para obras fantásticas. E talvez por vergonha de si mesmo, o filme tenha uma edição tão abrupta após a batalha, levando a um final rápido que impede qualquer possibilidade de digerirmos as cenas vistas.

Enquanto McConaughey se entrega ao papel de vilão unilateral com uma atuação sem carisma e preguiçosa, é notável o esforço de Elba em trabalhar com o material limitado em mãos. Também são divertidos os momentos de interação do protagonista com habitantes do nosso mundo (algo sabiamente aproveitado dos livros originais), apesar de gerarem novos questionamentos sobre a lógica do roteiro.

Buscando se apoiar em referências ao trabalho do autor norte-americano, com easter eggs desde os créditos de abertura até o quadro final, a película falha em se estabelecer como uma obra própria, sendo ineficiente em agradar leitores da saga original e nada convidativa para possíveis novos fãs. Apesar do rico universo em que se baseia, A Torre Negra é um filme sem vida, desprovido de qualquer nexo narrativo e que certamente esqueceu o rosto do pai.

Crítica: A Torre Negra  (2017)

Superficial disfarçado de complexo

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Sacrifício do Cervo Sagrado (2017): com divina retribuição, Ele virá para salvá-los

Com uma atmosfera que remete a Iluminado , com seus travelings com O Único Plano de Fuga de Stanley Kubrick , planos captados com uma lente que lembra uma visão extracorpórea da rotina do bem-sucedido cardiologista Steve ( Colin Farrel ), O Sacrifício do Cervo Sagrado tenta atrair sua atenção neste mês de fevereiro.  O Sacrifício do Cervo Sagrado (2017)  Com divina retribuição, Ele virá para salvá-los A história acompanha o personagem de Farrel, que mantêm contato frequente com Martin ( Barry Keoghan ), que perdeu o pai na mesa de operação na qual Steve trabalhava. Quando Martin começa a não obter a atenção desejada pelo cirurgião, coisas estranhas começam a acontecer a seus filhos. Ao acompanhar a família do médico e suas relações intrínsecas, sentimos que cada plano carrega uma estranheza suspensa e crescente pelo uso do zoom; ele te intima a mergulhar em cada diálogo na mesa de jantar, em cada andança sem pretensões pela ala de um hospital ansiando por achar o erro na imag

Homem de Ferro (2008) | O grande primeiro passo da Marvel Studios

Robert Downey Jr. sempre foi um ator talentoso, diferentemente do que muitos apontam. Apesar de seus encontros com a polícia em função das drogas, o astro sobreviveu a um intenso mergulho na dependência química e conseguiu dar a volta por cima naquele que, o próprio diretor Jon Favreau julga como um filme independente do gênero de super-herói. Sem contar com o modelo físico e com o caráter que o justificaria ao posto de protagonista, Tony Stark foi um acerto nos cinemas tão corajoso e sagaz quanto os quadrinhos do herói, criados lá em 1963 por Jack Kirby e Stan Lee . Na trama, o diretor Favreau narra o surgimento do universo Marvel a partir de um violento incidente na vida do bilionário Tony Stark, que, durante uma viagem ao Afeganistão (substituindo o Vietnã dos quadrinhos) para apresentar um novo armamento aos militares, é sequestrado por terroristas locais. Forçado a construir sua nova invenção sob pena de ser morto, Stark cria uma poderosa armadura para se libertar da cav

Paratodos (2016) | documentário necessário e inspirador

Paratodos (Brasil) À primeira vista, o documentário "Paratodos" (2016), dirigido por Marcelo Mesquita , pode parecer um daqueles especiais televisivos onde indivíduos com deficiências físicas contam suas histórias de superação. No entanto, ainda em seus primeiros minutos, percebemos a grande ambição do filme que, dividido em atos, um para cada modalidade esportiva, apresenta bem mais do que atletas paralímpicos vencendo dificuldades.  Rodado desde 2013, o documentário que, além do Brasil, traz cenas gravadas em outros países, esforça-se para sair do comum e apresenta seus personagens de forma a valorizar não só suas conquistas, mas revelar os estressantes bastidores de treinos e a rotina dos competidores paralímpicos, que muitas vezes é ainda mais complicada do que a de atletas regulares. A proposta é bastante importante para elevar a visibilidade destes atletas em nosso País, principalmente às vésperas de Olimpíadas, visto que seus feitos costumam ser bastante