Pular para o conteúdo principal

Sávio Fernandes: "Cadê as POCs? Cadê as sapatão? Cadê as trans?"

Destaque na 17ª edição do Noia -  Festival do Audiovisual Universitário, o estudante cineasta Sávio Fernandes saiu com três dos quatro prêmios de melhor filme oferecidos pelo Festival: pelo júri oficial, júri da TV e júri popular. O beneficiado de tamanha atenção foi Tommy Brilho, curta que Sávio produziu com apoio e realização da Universidade de Fortaleza (Unifor) em 2018. Tendo como principal característica o debate imediato sobre a visibilidade LGBT unido a um humor numa medida peculiar, Sávio vem acolhendo as diferentes repercussões proporcionadas pelo filme, enquanto espera ainda mais. Os efeitos visuais, então, para compôr a primeira (trans)parente da universidade, enchem os olhos por um processo de computação gráfica que além de compôr a mensagem alegórica da obra, ainda funciona com muito humor a diversos públicos.

Sávio Fernandes: "Cadê as POCs? Cadê as sapatão? Cadê as trans?"

Diretor de "Tommy Brilho" conversa com o Quarto Ato sobre o cinema universitário e carreira


Em um papo informal, Sávio responde ao Quarto Ato sobre a sua presença no cenário audiovisual de universidade, e a importância de todo o processo. Confira:


Qual a importância para você do cinema universitário? Como avalia a produção audiovisual de sua universidade?

No período da universidade é o momento de aprender, de errar, e se tudo der certo, de acertar. Vejo muitas produções bacanas sendo feitas na Unifor que os realizadores se sentem desanimados com o resultado, mas tento sempre ver esses filmes como primeiros passos de algo melhor que ainda está pra vir, já passei por muito sufoco para chegar no Tommy Brilho, e sinto que ele ainda é apenas um teaser de algo bem maior.

Sobre a premiação do "Tommy" no Noia, como foi sua reação e da equipe? Por onde o filme já passou e arrecadou prêmios?

Tou me sentindo uma estrela no red carpet hahahaah. É fantástico ter um trabalho de uma equipe maravilhosa que foi feito com tanto carinho sendo reconhecido e se destacando. Além do Noia, o filme já passou no Cine Virada na Bahia levando também 3 prêmios e já tem outros festivais pela frente, espero que renda algo também. 

Há o costume no cinema brasileiro de alcançar as massas pelo humor, mas a comédia de "Tommy" é diferente do que se vê, por exemplo, nas obras "regionais" de Halder Gomes, ou nos projetos da Globo. Como foi a construção do humor dentro do universo do Tommy?

Tommy é toda trabalhada no deboche, não queria fazer alguém rir apenas de situações engraçadas na tela, mas sim de que o filme brinca com ele mesmo. Penso que por conta das temáticas, isso acaba criando um recorte, e isso foi ótimo para poder focar em um público de forma que ele se sinta representado. Eu me inspirei bastante em alguns documentários falsos para levar a sério uma piada e brincar com isso do começo ao fim.

Um dos destaques do filme são os efeitos digitais. Fala sobre esse desafio tanto estético quanto moral de "apagar" uma pessoa fazendo referência imediata à marginalização e invisibilidade da comunidade LGBT. 

Eu tinha medo que os efeitos tirassem o foco da mensagem que o filme passa, mas depois percebi que isso seria interessante, pois o olhar de estranhamento que as pessoas fazem quando olham para esse ser invisível, é a mesma forma que nós LGBT+ somos vistos na rua ao quebrar um padrão normativo. Existe ET, robô e até esquilo herói em filmes da Marvel com super poderes, mas cadê as POCs? Cadê as sapatão? Cadê as trans? Infelizmente ainda somos invisíveis nesses filmes, e com esse filme, eu pude criticar isso.

Você também tem experiência na área do videoclipe, né? Conta essa experiência.

Cresci assistindo TV União, MTV, Multishow... Quando tocava Toxic eu performava desviando dos raio lasers em frente a TV, então clipes sempre foram uma grande inspiração pra mim. Além do Tommy, que tem diversos momentos musicais, sempre tento trabalhar com música. Já realizei alguns clipes como Who’s the Man? de uma Banda da Irlanda, mas é meu sonho fazer um clipe de algum artista local.

Projetos "solo" para o futuro, já tem em mente? Tommy ainda volta um dia?

Ai… muitos projetinhos em breve, não posso falar muito ainda, mas vem coisa bacana ein... hahahahahah brincadeira, esse ano ainda sai um novo clipe, dessa vez uma banda dos EUA. Estou gravando um longa metragem documental com um coletivo de amigos, mas estou sim desenvolvendo uma web série com toda essa estética já abordada no Tommy Brilho, em breve no Youtube mais perto de vocês hahahaha. Mas infelizmente no momento atual é tudo muito incerto, o cenário político assusta bastante nós que trabalhamos com arte, temos agora que lutar para que nossa voz não seja silenciada pois ainda temos muito para falar.

...

Confira o trailer de "Tommy Brilho" 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Sacrifício do Cervo Sagrado (2017): com divina retribuição, Ele virá para salvá-los

Com uma atmosfera que remete a Iluminado , com seus travelings com O Único Plano de Fuga de Stanley Kubrick , planos captados com uma lente que lembra uma visão extracorpórea da rotina do bem-sucedido cardiologista Steve ( Colin Farrel ), O Sacrifício do Cervo Sagrado tenta atrair sua atenção neste mês de fevereiro.  O Sacrifício do Cervo Sagrado (2017)  Com divina retribuição, Ele virá para salvá-los A história acompanha o personagem de Farrel, que mantêm contato frequente com Martin ( Barry Keoghan ), que perdeu o pai na mesa de operação na qual Steve trabalhava. Quando Martin começa a não obter a atenção desejada pelo cirurgião, coisas estranhas começam a acontecer a seus filhos. Ao acompanhar a família do médico e suas relações intrínsecas, sentimos que cada plano carrega uma estranheza suspensa e crescente pelo uso do zoom; ele te intima a mergulhar em cada diálogo na mesa de jantar, em cada andança sem pretensões pela ala de um hospital ansiando por achar o erro na imag

Homem de Ferro (2008) | O grande primeiro passo da Marvel Studios

Robert Downey Jr. sempre foi um ator talentoso, diferentemente do que muitos apontam. Apesar de seus encontros com a polícia em função das drogas, o astro sobreviveu a um intenso mergulho na dependência química e conseguiu dar a volta por cima naquele que, o próprio diretor Jon Favreau julga como um filme independente do gênero de super-herói. Sem contar com o modelo físico e com o caráter que o justificaria ao posto de protagonista, Tony Stark foi um acerto nos cinemas tão corajoso e sagaz quanto os quadrinhos do herói, criados lá em 1963 por Jack Kirby e Stan Lee . Na trama, o diretor Favreau narra o surgimento do universo Marvel a partir de um violento incidente na vida do bilionário Tony Stark, que, durante uma viagem ao Afeganistão (substituindo o Vietnã dos quadrinhos) para apresentar um novo armamento aos militares, é sequestrado por terroristas locais. Forçado a construir sua nova invenção sob pena de ser morto, Stark cria uma poderosa armadura para se libertar da cav

Paratodos (2016) | documentário necessário e inspirador

Paratodos (Brasil) À primeira vista, o documentário "Paratodos" (2016), dirigido por Marcelo Mesquita , pode parecer um daqueles especiais televisivos onde indivíduos com deficiências físicas contam suas histórias de superação. No entanto, ainda em seus primeiros minutos, percebemos a grande ambição do filme que, dividido em atos, um para cada modalidade esportiva, apresenta bem mais do que atletas paralímpicos vencendo dificuldades.  Rodado desde 2013, o documentário que, além do Brasil, traz cenas gravadas em outros países, esforça-se para sair do comum e apresenta seus personagens de forma a valorizar não só suas conquistas, mas revelar os estressantes bastidores de treinos e a rotina dos competidores paralímpicos, que muitas vezes é ainda mais complicada do que a de atletas regulares. A proposta é bastante importante para elevar a visibilidade destes atletas em nosso País, principalmente às vésperas de Olimpíadas, visto que seus feitos costumam ser bastante