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A Viagem Extraordinária de Celeste García: Bye bye tristeza

Meu amigo Arthur Gadelha, grande conhecedor de loucuras cinematográficas, entende a minha paixão por cinema que se arrisca. Dos filmes que me lembro, Bacurau e Era uma vez em… Hollywood foram os últimos nessa picardia autoral que permite que o público se divirta com a história, enquanto os personagens se apaixonam por algo específico e brincam entre si. No filme de Quentin Tarantino, por exemplo, temos uma memória dentro de uma memória. Já no de KMF e de Juliano Dornelles, temos a torcida por uma reação de violência diante dos algozes do drama. Exatamente por compartilharmos dessa viagem, o colega me convidou para A Viagem Extraordinária de Celeste García, comédia que mistura drama, romance e ficção científica.

A Viagem Extraordinária de Celeste García: Bye bye tristeza

  CRÍTICA  

No entanto, não é um sci-fi tradicional. Pegando emprestado elementos de Shaun of the Dead de Edgar Wright, o filme vai, aos poucos, criando uma tensão, mesmo que os personagens do universo não se importem muito com o que está por vir. Esse cerne, escrito e dirigido por Arturo Infante, se assume, logo em seu primeiro ato, como um longa político, a qual explora mudanças, amadurecimento e toda situação precária da ilha caribenha. 

Em sua jornada, conhecemos Celeste, professora de um planetário que, apaixonadamente, explica sobre os mistérios do universo. Entre essa viagem ao desconhecido, a mulher fala de estrelas extintas há milênios e sobre o Cosmos, um portal ao mais íntimo passado, pode atuar em nossas vidas. Em seguida, Celeste descobre, ao assistir um comunicado oficial, que Cuba está sendo invadida por alienígenas e que, no atual momento, convidam os cubanos a visitar sua terra. Viúva e desiludida, Celeste aceita e se voluntaria.

Sim, é uma comédia cubana extremamente divertida. Muito se deve à atriz Maria Isabel Díaz, que já trabalhou com Mel Gibson e Pedro Almodóvar. Aqui ela sabe pontuar carisma na hora certa e suga o espectador de modo apaixonante, lembrando a já falecida Emmanuelle Rivá no bobinho, mas empolgante, Perdidos em Paris.


Entretanto, o foco está no latente (e proposital) discurso crítico. Sendo conhecido por sua perspectiva tradicional de alfinetar os problemas da nação, o cinema cubano enfatiza algumas das mazelas nos personagens que se voluntariam para essa jornada. Todos possuem o mesmo infeliz problema: falta de relevância por parte do governo. Presente no DNA dos protagonistas, a obra mostra como o desespero de todos por deixar aquela ilha é maior que qualquer coisa. É maior que a própria vida, como muito deles apontam desesperadamente.

Celeste não superou a morte e abusos de seu ex-esposo e por isso procura uma missão acima de sua própria existência. Os demais, no entanto, querem entrar na nave, como se fosse uma balsa, e chegar no continente em busca de algo melhor. Sem perspectivas de melhoria de vida, tudo, absolutamente tudo, vale em busca de algo melhor. E assim a graça vai se esvaziando para entrar o drama de pessoas cheias de defeitos e dispostas a encontrar uma mudança nas condições atuais.

Cuba, nesse caso, não é muito distante do Brasil. O pouco de esperança que nós temos, acabamos por desvalorizar. Engraçado que, às vezes, ele pode estar do nosso lado.

Filme assistido no 29º Cine Ceará - Festival Ibero-americano de Cinema

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