Pular para o conteúdo principal

Sense8 (1° temporada, 2015) | “O que está acontecendo?”


A Netflix estreou dia 5 de junho a série de ficção científica Sense8, escrita, produzida e dirigida pelos irmãos Wachowskis e por J. Michael Straczynski. O que vem à sua cabeça quando você lembra dos Wachowskis? Matrix, provavelmente. Depois do sucesso grandioso que os irmãos tiveram com o filme Matrix, muito se esperou deles em seguida, mas o que veio depois foram filmes que não agradaram o público e nem a crítica. E aí surge depois de muitos anos, uma aposta audaciosa de uma série que seria produzida pela Netflix, que tinha “a missão” de trazer de volta ao jogo o sucesso dos irmãos Wachowskis.


A história de Sense8 se passa após um evento peculiar; Jonas (Naveen Andrews) tenta salvar Angelica (Daryl Hannah) de Mr. Whispers (Terrence Mann) que quer matá-la. Ela acaba se matando um pouco antes de Mr. Whispers a encontrar, não antes de ativar outros oito denominados “sensates” ao redor do mundo. Oito pessoas que não se conhecem ficam interligadas mentalmente e precisam lidar com os perigos de suas novas vidas. Um disparo. Uma morte. Um instante no tempo em que oito mentes em seis continentes são interligadas para sempre. Oito pessoas vivem suas vidas, segredos e ameaças como uma. São pessoas comuns, renascidas com um mesmo inimigo e destino. São eles Will de Chicago; Riley uma islandesa que vive em Londres; Capheus de Nairobi; Sun de Seoul; Lito da cidade do México; Kala de Mumbai; Wolfgang de Berlin e Nomi de San Francisco.


Sense8 é bastante diferente de tudo que há por ai e aborda questões bastante polêmicas da atualidade de forma mais humanizada e sensível. A série é bastante política, ativista e coerente com as questões da comunidade em geral, mas principalmente com a LGBT. Os personagens foram tão bem escritos que a empatia por eles é imediata, a capacidade de transmitir a sensibilidade necessária sobre os relacionamentos interpessoais, foram feitas com maestria pelos irmãos Wachowskis. E não para por aí; ao colocar personagens de diferentes regiões do planeta, Sense8 se define pelo multiculturalismo, ilustrando diversas formas de viver.


Nos três primeiros episódios você não entende bem o que acontecendo e se faz inúmeros questionamentos sobre o que passa na série. Surge então o episódio quatro, chamado “What's Going On?”, traduzindo "O que está acontecendo?". No finalzinho do episódio, Riley, uma das sensates coloca a música “What's Up?” do grupo 4Non Blondes para tocar em seu iPod. Ao mesmo tempo o personagem Wolfgang canta o hit em um karaokê em Berlim. Em seguida, todos os personagens se conectam com a canção e talvez assim dando início a uma revolução e união entres os oito principais personagens.

S01E04 "What's Up?"


A canção talvez seja a melhor forma de traduzir o significado de Sense8, “O que está acontecendo?”. Não se sabe até então, nem os personagens e nem telespectadores têm a resposta. E talvez esse seja o grande trunfo da série. Ao apresentar na narrativa os sensates, de certa forma é como se através dos personagens conectados, a série “abrisse a mente” dos espectadores. É assim, através das histórias dramáticas e da sensibilidade no retrato dessas conexões, que Sense8 conquista o público. No decorrer da temporada, os irmãos Wachowskis ensaiam sequências de incrível ressonância, não pela ação, nem pela ficção científica em si, mas pelo sentimento humano compartilhado.

Os roteiristas ao optarem por uma história cujo núcleo se trata do psicológico humano, passam a carregar uma carga de responsabilidades em seus ombros, especialmente quando a montagem desta série exige que o conteúdo seja transmitido de forma clara, sucinta e ao mesmo tempo cativante e realística. Por meio das linhas narrativas dos personagens, com seus modos de vida distintos um dos outros, os observamos enfrentar problemáticas que muitas vezes são um traço cultural de um local ou parte de uma estrutura social. A narrativa utilizada, felizmente, retrata tais problemas como parte de um cotidiano presenciado por muitos, sem utilizar um tom de manifesto ou revolta. Dessa forma, a série adquire um tom autêntico e instigante.

Sense8 inova por sua diversidade de contos, no entanto, seu desenvolvimento falha na originalidade. Ao longo história passamos a perceber situações comuns, vistas muitas vezes em outras histórias; por exemplo, o casamento indiano, apesar de Rajan se mostrar um ótimo noivo, não é a pessoa que Kala ama e deseja passar o resto da vida. A série tenta contornar este fato dirigindo a atenção do espectador para a ficção científica. Desse modo, os roteiristas possuem a liberdade de acrescentar traços que diferenciam os personagens e as situações em que se encontram.

S01E06

Um ponto de extrema importância na série é o gradual vínculo dos personagens. No início o conhecimento da capacidade dos sensates ainda era bastante nebuloso, aos poucos aprenderam a se adaptar e tirar proveito das capacidades dos seus “irmãos”, ao mesmo tempo tornaram-se pessoas tão semelhantes mesmo com suas particularidades, que os oito indivíduos de diferentes lugares tornam-se apenas um. Assim, a série expõe cenas tanto de companheirismo quanto de luxúria, tão bem orquestradas que transmitem a ideia que há um sentimento mais intenso que os une. 

Sense8 é, sem dúvida, uma série cuja audácia dos criadores teria tudo para ser fadada ao fracasso e a desordem, no entanto, Michael Straczynski e os Wachowskis triunfaram esplendidamente com a genial montagem. Os movimentos de câmera e esquemas de luz e sombra impedem que o espectador se confunda, pelo contrário, as cenas exercem fascinação geral no público. Os atores, muito bem escolhidos, se entregam aos seus respectivos personagens, tornando suas interpretações convincentes, despejando a carga de sentimentalismo que cada personagem exige. Tudo isso acompanhado de uma trilha sonora com tons graves em grande parte dos momentos, criada por Johnny Klimek e Tom Tykwer, que também colaboraram com os Wachowskis ao criarem a trilha sonora de A Viagem. 

Ao final da série, quase todos os problemas pessoais dos sensates são resolvidos por meio da parceria de todos, no entanto, há uma série de questões que não foram exploradas suficientemente. Não é explicado o porquê da BPO está caçando os sensates ou quem é exatamente o Mr. Whispers. Apesar destas desconfortantes lacunas, os Wachowskis possuem a liberdade de ousar mais na próxima temporada, respondendo as dúvidas pendentes e, é claro, nos deleitando com mais imagens impressionantes.

Resenha escrita pela equipe de séries, Ana Karla Araújo e Letícia Belo.

Crítica: Sense8 (1° temporada, 2015)

“O que está acontecendo?”

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Leonard Nimoy, eterno Spock, morre aos 83 anos

A magia que um personagem nos passa, quando sincera, é algo admirável. Principalmente quando o ator fica anos trabalhando com a mesma figura, cuidando com carinho e respeitando os fãs que tanto o amam também. E, assim foi Leonard Nimoy . O senhor Spock de Jornada nas Estrelas , que faleceu ontem (27/02) por causa de uma doença pulmonar, aos 83 anos. O ator, diretor, escritor, fotógrafo e músico deixou um legado imenso para nós. E isso é algo que ele sempre tratou com muita paixão: a arte. A arte de poder fazer mais arte. E com um primor de ser uma boa pessoa e querida por milhares. E por fim, a vida atrapalhou tal arte. Não o eternizou como o seu personagem. Mas apenas na vida, pois no coração e na memória de todos, o querido Nimoy vai permanecer perpétuo nessa jornada. Um adeus e um obrigado, senhor Leonard Nimoy, de Vulcano. Comece agora, sua nova vida longa e próspera, onde quer que esteja.

Mad Max (1979) | O cinema australiano servindo de influência

Para uma década em que blockbusters precisavam ter muitos efeitos visuais e grandes atros do momento, como em Alien - O Oitavo Passagéiro , Star Wars , Star Trek  etc, George Miller teve sorte e um roteiro preciso ao provar que pode se fazer filme com pouco dinheiro e com um elenco de loucos.   Mad Max , de 1979, filme australiano com uma pegada  exploitation,  western e de filmes B, mas que conseguiu ser a estrada para muitos filmes de ação de Hollywood atualmente.   Miller, dirigiu, escreveu e conseguiu com um orçamento de 400 mil filmar um dos mais rentáveis do planeta. O custo do filme foi curto e assim, tudo foi pensado no roteiro e nos diálogos que o filme ia exibir. Como os textos sobre o futuro, humanidade e seu fim, e o Max do título. O filme é rodado com o Mel Gibson sendo o centro. Seus diálogos curtos demonstram o homem da época, e com uma apologia ao homem do futuro. Uma pessoa deformada pelas perdas e com a vontade de ter aquilo que não pode ter, e que resulta no

O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos (2014) | Peter Jackson cumpre o que prometeu

    Não vamos negar que a trilogia O Hobbit possui grandes problemas. O que é uma pena, já que a trilogia anterior ( O Senhor dos Anéis ) não tem falha alguma. Contudo, o que tinha de errado em Uma Jornada Inesperada e Desolação de Smaug , o diretor Peter Jackson desfaz nessa última parte. O que é ótimo para os espectadores e crível para os adoradores da saga da terra-média de longa data.     O filme apresenta problemas diversos, por exemplo, um clímax logo na primeira cena (se é que você me entende) e um personagem que não consegue momento algum ser engraçado. Falhas como essas prejudicam o filme como todo. O roteiro, por ser o mais curto dos três, precisava de mais tempo em tela, e dessa forma, cenas e personagens sem carisma são usados repetidas vezes e com uma insistência sem ter porquês. Mas, em contra partida, O Hobbit e a Batalha dos Cinco Exércitos consegue ser mais direto, objetivo e simples que seus antecessores, que são longos e cheios de casos como citei. E o real mo