Pular para o conteúdo principal

O Quarto de Jack (2015) | O confinamento de nossas vidas


Room (Canadá, Irlanda)
Intenso e bastante ambicioso em alguns aspectos, "O Quarto de Jack" (Room, 2015) é um filme dirigido por Lenny Abrahamson ("Frank", 2014) e baseado no livro de Emma Donoghue (leia resenha aqui), que adaptou a própria obra para roteiro neste longa-metragem. O resultado é uma produção que destaca-se pelo desempenho exemplar de sua dupla protagonista, além das polêmicas temáticas abordadas.

Contado sob a perspectiva de Jack (Jacob Tremblay), uma criança de cinco anos, o filme desenvolve-se a partir da relação do garoto com sua mãe, Joy Newsome (Brie Larson), uma jovem garota que foi sequestrada há sete anos e confinada em um galpão. Denominado por ambos como "Quarto", Jack nasceu dentro do local e nunca teve contato com o mundo exterior, estabelecendo rotina dentro do espaço. Após o quinto aniversário do menino, a dupla tenta realizar um esquema de fuga do sequestrador, conhecido como "Velho Nick" (Sean Bridgers).

A ideia por trás de "O Quarto de Jack" é nada menos do que brilhante e desafiadora. Com as principais cenas filmadas em um ambiente fechado e pequeno, o filme assusta por trazer uma situação possível de ocorrer na realidade, tendo vista a existência de crimes por confinamento. A partir dessa pauta, a trama ainda aborda temas como estupro, depressão e maternidade, sempre sob uma atmosfera psicológica que propõe reflexões em torno da existência. Afinal, não é nada fácil explicar para uma criança situações tão complexas quanto as que ocorrem.

É exatamente em decorrência deste fator que percebemos o quão bem-executadas estão as performances de Brie Larson ("Descompensada", 2015) e Jacob Tremblay ("Os Smurfs 2", 2013); cheias de química e extremamente necessárias para o funcionamento do filme. Larson encara uma personagem difícil e constituída por camadas que pairam entre o amor e a instabilidade mental, entregando-a de forma competente. O jovem Tremblay, por sua vez, revela-se um talento mirim promissor, esbanjando carisma ao apresentar uma criança inteligente e confusa que descobre o mundo pela primeira vez.

A direção de Brahamson é inteligente e segue fiel à proposta da perspectiva infantil, entregando um filme cuja imersão do público contribui bastante para a compreensão de sua atmosfera. A já conhecida fotografia de Danny Cohen ("O Discurso do Rei", 2010; "Os Miseráveis", 2012), com seus enquadramentos fechados, auxilia bastante nesse ponto, principalmente quando comparamos as sequências iniciais no Quarto com as de encerramento. O roteiro acerta em diversas cenas-chave, trazendo para o público uma história que tempos atrás era considerada como inadaptável devido às suas limitações, e a trilha de Stephen Rennicks encontra notoriedade quando bem deve, contribuindo bastante para o êxito da produção.

Como resultado, "O Quarto de Jack" revela-se uma ótima experiência cinematográfica; um drama denso que desabrocha como um convite de Jack à descoberta da vida, de forma que nos faz refletir por bastante tempo sobre todas as possibilidades que estão no imenso mundo à nossa volta, mas que muitas vezes não exploramos por estarmos presos ao nosso próprio confinamento.

Avaliação:


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A Morte do Demônio (2013) | Reimaginação do "Conto Demoníaco"

The Evil Dead (EUA) Em 1981, Sam Raimi conseguiu realizar algo extraordinário. Com um orçamento baixíssimo (em volta de 1,5 mil), o diretor reinventou os filmes idealizados dentro de uma cabana com jovens e demônios. Além disso, ainda conseguiu fãs por todo o planeta que apreciavam a maneira simples e assustadora que o longa fora realizado. Em 2009, Raimi entrou em contato com Fede Alvarez por seu recente curta-metragem viral que rolava pela internet. A conversa acabou resultando na id eia de uma reinvenção do “conto” original de 1981. Liberdade foi dada à Alvarez para que tomasse conta da história. Percebe-se, a início, a garra deste para uma boa adaptação, no entanto, ainda peca por alguns problemas graves percebíveis tanto para quem é ou não é fã do original. Ao que tudo indicava, seria um Reboot. Mas se trata, na realidade, de uma (aparentemente) continuação audaciosa. A audácia já começa no pôster de divulgação: “O Filme Mais Aterrorizante que Você Verá Nesta Vida”...

Anúncio Oficial [Duas Faces do Cinema: Quarto Ato]

Desde que nós dois, Arthur Gadelha e Gabriel Amora, sentamos para decidir o nome do blog de cinema que escreveríamos a partir dali, e entramos no acordo que “Duas Faces do Cinema” intitularia o projeto, já sabíamos, mesmo sem dizer um para o outro, que ele não perduraria para sempre; não como principal. No entanto, assim que lançado, ainda com um fundo preto e branco, separando o casal principal do grande vencedor do Oscar, “O Artista”, a marca “Duas Faces do Cinema” ganhava espaço entre amigos e familiares.

O Retrato de Dorian Gray | Os segredos de Dorian

Oscar Fingal O’Flahertie Wills Wilde nasceu em 1854 em Dublin, estudou na Trinity College de Dublin e, posteriormente, no Magdalen College em Oxford. Seu único romance foi O retrato de Dorian Gray e seu sucesso como dramaturgo foi efêmero. Morreu em 1900 em Paris, três anos após ter sido libertado da prisão por ter sido pego em flagrante indecência.  O retrato de Dorian Gray foi publicado pela primeira vez em 1891 em formato de livro em uma versão bastante modificada do romance original de Oscar Wilde, pois foi considerado muito ousado para sua época. Já tinha sido editado quando publicado em série na revista literária Lippincott’s em 1890 e depois ainda foi alterado pelo próprio Wilde, que em resposta às duras críticas, fez sua própria edição para a publicação em livro. Estamos falando de uma Inglaterra do século XIX bastante tradicionalista e preconceituosa, assim, a versão original, tirada do manuscrito de Wilde, nunca havia vindo a público. Nicholas Frankel, professor de I...