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De Longe Te Observo (2016) | Um ensaio sobre voyeurismo e silêncio

Desde Allá (Venezuela)
Desde o início do cinema é comum aos países em crise manifestações artísticas ligadas à sétima arte. De Eisenstein na Rússia até Lanthimos na Grécia, movimentos cinematográficos são criados, apresentando novas estéticas e linguagens; é o que ocorre no cinema latino-americano atualmente, apresentando um cinema cru e de cunho social. O cinema venezuelano, apesar de tímido perante aos demais países do bloco, apresenta maturidade em De Longe Te Observo.

O filme conta a história de Armando (Alfredo Castro), um homem que atrai jovens para sua casa em troca de dinheiro. Solitário, sua completude está no ato de observar estes rapazes, sempre à distancia. Um deles é Elder (Luis Silva), membro de uma gangue que comete pequenos delitos; a trama segue entorno destes dois personagens de realidades opostas e das turbulências subsequentes de suas vidas.

A oposição é o meio de legitimação do discurso de Lorenzo Vigas, que coloca a linguagem a serviço do desencontro dos dois personagens. Enquanto Armando trabalha em uma loja de implantes dentários, exercendo uma função minuciosa e sensível, Elder é funcionário de um ferro-velho. O filme apresenta enquadramentos precisos, distanciando os personagens através de molduras ou móveis; o olhar do espectador busca uma harmonia que é reprimida através da estética e do silêncio. Além disso, Vigas utiliza-se de quebras de eixo e desfoques para contribuir com o estranhamento presente no filme.

O cinema é, por excelência, uma concretização do voyeurismo. O estado de assistir um filme, observar os personagens e ser tolhido de interação direta faz de um espectador, um voyeur. A contemplação de Armando para com os jovens é a mesma do público para com o filme; a metalinguagem do voyeurismo presente em De Longe Te Observo colabora com a eficiência do discurso, evidenciando a passividade do espectador.

O grande vencedor do Festival de Veneza de 2015 leva consigo a responsabilidade de ser o ímpeto do cinema venezuelano contemporâneo. Transitando entre Não Amarás (1988), de Krzysztof Kieslowski e Batalha no Céu (2005), de Carlos Reygardas, De Longe Te Observo é uma abordagem sensível de um país desestabilizado.

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