Pular para o conteúdo principal

Perfeita é a Mãe (2016) | Esteriótipos e linguagem rasa

Amy (Mile Kunis) é uma mulher à beira de um ataque de nervos que faz milagres dividindo sua rotina entre os filhos, trabalho, academia e um marido que se torna um estorvo em sua vida. Ela é intensamente cobrada por todos, que não reconhecem suas façanhas e acabam tomando-a como uma mulher que faz de tudo mas não consegue se destacar em nada, já que está sempre chegando atrasada, perdendo reuniões e não se dedicando o suficiente para que todo o universo funcione bem. 

Para os filhos ela é a carona que se atrasa, para o marido, a mulher que não lhe satisfaz, "obrigando-o" a buscar outras formas de prazer. Para seu chefe é aquela que perde reuniões ~ vazias ~ por estar presa entre um compromisso e outro, para a representante das mães na escola ela é aquela que foge das responsabilidades. Incomodada, Amy irá explodir em algum momento. E assim o faz, jogando todas as obrigações de ser perfeita para o ar e buscando aproveitar um pouco de sua vida ao lado de duas outras mães.

O problema central do filme está no reforço do esteriótipo. Amy não é uma mulher, mas uma mãe, não é uma profissional, mas alguém que precisa trabalhar para sustentar os filhos, não faz ginástica porque precisa se manter saudável, mas porque precisa estar em forma para a correria com... os filhos. E mesmo quando joga tudo para o alto, seu mundo continua a girar em torno deles. Há uma evidente anulação do caráter feminino até mesmo em uma das cenas em que ela decide fazer sexo com um outro homem e sua amiga lhe ensina não a ter prazer, mas a dar prazer a ele através do sexo oral. Em suma, o mundo das "mães" se resume em satisfazer os desejos de outros e não os dela. 

Os diálogos são visivelmente rasos, causando intenso constrangimento em muitos momentos da fita. Sabe aquela resposta fundamental que a protagonista dá depois que é humilhada por outra, o famoso fora que ficamos bestas imaginando como não pensamos nisso antes? Pois é, isso não existe, e o que temos são diálogos frágeis de uma mulher que não sabe bem o que quer ou o que deseja. Seus extensos pedidos de desculpas mostram que nem com a liberdade reclamada ela sairá do papel que lhe deram de serventia. A propagada rixa entre as mulheres também é reforçada quando as mães dividem-se entre serem perfeitas e seguirem o modelo proposto ou reconhecerem-se imperfeitas. 

O caráter machista da película também não favorece os homens, mostrados, em sua maioria como desocupados e totalmente alheios aos seus deveres como pais. Aqui não há um só momento em que os personagens apontam para que a convivência marital tenha como base a igualdade e a divisão de tarefas. Há, antes, uma reclamação de uma mulher que quer ser reconhecida, mas não luta para que o outro cumpra com suas obrigações. Não há uma só fala da personagem que indique ao seu marido que ele é um babaca e que errou feio com seus atos. Uma das personagens é a escrava do lar, e soa totalmente falso a regeneração de seu marido, que se torna passivo diante dela. É como se somente houvesse dois lugares na vida familiar: um mandar e outro obedecer. Aos filhos mimados, a cobrança diária da serventia de um ou de outro. 

Para não dizerem que só há momentos ruins, destaco a presença de Wanda Sykes, fazendo uma ponta como uma terapeuta de casal. É o tipo de atriz que mesmo sem nada a fazer, salva alguns momentos. 

Christina Applegate, Mila Kunis, Kathryn Hahn, Kristen Bell e Jada Pinkett Smith. É o melhor momento, embora mesmo aqui haja um reforço do papel de todas no mundo: elas elogiam as filhas, julgando-as "boas mães".

Avaliação

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A Morte do Demônio (2013) | Reimaginação do "Conto Demoníaco"

The Evil Dead (EUA) Em 1981, Sam Raimi conseguiu realizar algo extraordinário. Com um orçamento baixíssimo (em volta de 1,5 mil), o diretor reinventou os filmes idealizados dentro de uma cabana com jovens e demônios. Além disso, ainda conseguiu fãs por todo o planeta que apreciavam a maneira simples e assustadora que o longa fora realizado. Em 2009, Raimi entrou em contato com Fede Alvarez por seu recente curta-metragem viral que rolava pela internet. A conversa acabou resultando na id eia de uma reinvenção do “conto” original de 1981. Liberdade foi dada à Alvarez para que tomasse conta da história. Percebe-se, a início, a garra deste para uma boa adaptação, no entanto, ainda peca por alguns problemas graves percebíveis tanto para quem é ou não é fã do original. Ao que tudo indicava, seria um Reboot. Mas se trata, na realidade, de uma (aparentemente) continuação audaciosa. A audácia já começa no pôster de divulgação: “O Filme Mais Aterrorizante que Você Verá Nesta Vida”...

Anúncio Oficial [Duas Faces do Cinema: Quarto Ato]

Desde que nós dois, Arthur Gadelha e Gabriel Amora, sentamos para decidir o nome do blog de cinema que escreveríamos a partir dali, e entramos no acordo que “Duas Faces do Cinema” intitularia o projeto, já sabíamos, mesmo sem dizer um para o outro, que ele não perduraria para sempre; não como principal. No entanto, assim que lançado, ainda com um fundo preto e branco, separando o casal principal do grande vencedor do Oscar, “O Artista”, a marca “Duas Faces do Cinema” ganhava espaço entre amigos e familiares.

O Retrato de Dorian Gray | Os segredos de Dorian

Oscar Fingal O’Flahertie Wills Wilde nasceu em 1854 em Dublin, estudou na Trinity College de Dublin e, posteriormente, no Magdalen College em Oxford. Seu único romance foi O retrato de Dorian Gray e seu sucesso como dramaturgo foi efêmero. Morreu em 1900 em Paris, três anos após ter sido libertado da prisão por ter sido pego em flagrante indecência.  O retrato de Dorian Gray foi publicado pela primeira vez em 1891 em formato de livro em uma versão bastante modificada do romance original de Oscar Wilde, pois foi considerado muito ousado para sua época. Já tinha sido editado quando publicado em série na revista literária Lippincott’s em 1890 e depois ainda foi alterado pelo próprio Wilde, que em resposta às duras críticas, fez sua própria edição para a publicação em livro. Estamos falando de uma Inglaterra do século XIX bastante tradicionalista e preconceituosa, assim, a versão original, tirada do manuscrito de Wilde, nunca havia vindo a público. Nicholas Frankel, professor de I...