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Harry Potter e o Enigma do Príncipe (2009) | Potencial em xeque

Harry Potter and the
Half-Blood Prince (EUA)
‘Harry Potter’ é uma saga de muitos tons; nada mais correto a uma serie que busca acompanhar o amadurecimento “natural” de seus personagens. E, embora ‘Ordem da Fênix’ abra o precedente sombrio apresentando um clima “pré-caótico” e um alarme sobre o risco real de Voldemort, ‘Enigma do Príncipe’ contém elementos mais ‘perturbadores’ – o livro. O filme (segundo de David Yates), porém, somente tenta ter toda sua significância. Parte do seu impacto é excepcional, e até funciona de modo isolado. Mas sua fraca abordagem de temas “secundários” é desperdiçada quase por inteiro – o que é uma pena imensa.

O paradoxo sensível é constantemente ofuscado. De um lado uma invasão assombrosa nas motivações e destinos de alguém tão instigante como Voldemort e, do outro, relações amorosas forçadas (difícil saber o que é mais irritante: a atenção superficial de Rony e Lavender Brown, a “sofrência” da Hermione ou a atração entre Harry e Gina). E a imersão admirável de David Yates e seu fotógrafo Bruno Delbonnel entrega ao filme um controverso “tom pastel” esverdeado que parece anos-luz, não especificamente das tramas românticas ali retratadas, mas da intenção da abordagem.

Diferente das nuances de alguns “vilões” que deixam de ser atrativos em certos pontos da saga, Voldemort é um exemplo de mistério que não cansa - mesmo em oito extensos filmes. “Enigma” se torna crucial, portanto, ao apresentar uma fatia nova aos seguidores. E dessa vez, a proximidade a trama não se dá por mais um encontro típico entre ‘herói e vilão’ como acontece na maioria dos anteriores. A ausência de Voldemort assusta mais que a de Dumbledoore no quinto filme. As ganâncias de Tom Riddle, finalmente, assustam. E disso, Yates se aproveita muito bem. Algumas das melhores cenas de toda a saga, exatamente por isso, estão aqui. 

Ao revelar que aqueles mistérios estão em torno de Harry desde o início, citações de símbolos de outros filmes fortificam a mensagem – a ideia de que Dumbledoore enfrentou toda a questão silenciosamente torna seu clima sombrio ainda mais envolvente.

Sua conclusão, inclusive, encaminha-se muito ciente do peso do que informou até aquele momento. Acusa, com muita propriedade, o que Harry terá de enfrentar dali para frente. A sensação de solidão e angústia se torna bem definida com a sucessão de acontecimentos. A sequência da caverna, da torre, das varinhas e do príncipe (todas tão arrepiantes quanto o sentimento do livro) fazem de seu “desfecho” muito mais que o fim do filme – é um desfecho de seis histórias que passam a fazer mais sentido. A partir de então, uma jornada completamente distinta se apresenta no caminho – e o ponto de virada de “Relíquias – Parte 1” honra tudo isso.

E é uma pena que a famosa e esperada sequência do velório de Dumbledoore não esteja no filme. Compreendo a decisão climática de Yates – a cena facilmente poderia ser ofuscada por tantos ápices finais que alcança e a força inigualável do personagem estaria em risco. O que não justifica, porém, sua última cena. O adeus de Harry, Hermione e Rony se dá por uma função narrativa muito fraca. O real desfecho calmo e inexpressivo enfraquece todo sentimento de incerteza que precede as últimas partes da saga. 

‘Enigma do Príncipe’ é essa contradição eterna. Um filme de importância inestimável e de emoção única. Mas inconsistente como um produto geral.



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