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Até o Último Homem (2017) | Marcas da violência

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Hacksaw Ridge (EUA)
Até o Último Homem não é muito diferente de outros filmes dos últimos anos sobre guerras. Os clichês, diálogos e situações se repetem em Hollywood há muito, principalmente na academia, a qual se especializou em indicar e premiar obras com essa premissa óbvia de patriotismo norte-americano. A dessemelhança aqui é o diretor. Mel Gibson, vencedor do Oscar por Coração Valente em 1996, retorna com a fluidez que o fez ser um artista mais competente por trás das câmeras. 

O filme abre espaço para algo que, sem muitas surpresas, se tornou o foco original do longa-metragem: a fé. O herói da vez, interpretado por Andrew Garfield, é Desmond Doss, um homem que foi para Segunda Guerra Mundial sem usar nenhuma arma, seja para o ataque ou defesa. O personagem, com um desenvolvimento muito ágil no primeiro ato, mostra os seus motivos e o que o inspirou em ser um homem de tamanha convicção e fé.

Os dois primeiros seguimentos, deste modo, se concentram em apresentar a sua luta contra os preconceitos do grupo que o reprovava e o taxava de covarde. Nessas sequências, o clichê vai ganhando forças. A gangue, com vários homens mais fortes que ele, o persegue, tortura psicologicamente e o agride como se fosse algo chocante o suficiente de digerir. Gibson aposta no piegas de relacionar intimamente aqueles personagens com humor, e de afastar Garfield, o que acaba por gerar a evidente identificação.

É explícito, mas funciona. A determinação de Garfield em interpretar o protagonista é de impressionar e de afastar qualquer traço enfadonho de O Espetacular Homem-Aranha. Sua fisicalidade demonstra a fraqueza necessária, e o seu carisma resulta em empatia, como em muitos filmes de confrontos não o fazem. Já os diálogos, apesar de redundantes, buscam a emoção nas suas saídas sarcásticas e em monólogos cristãos.

Com isto, Gibson cria um sofrimento ágil através das conversações que atingem Doss e o público, independentemente de fé, religião ou crença. A falta de compreensão para o diferente encontra a metalinguagem atual, e o cafona do texto se torna algo verdadeiro e, impressionantemente, hodierno.

E, no meio de tudo, o diretor apresenta pequenas sutilezas do que estar por vir; E quando chega, só nos resta ovacionar. A violência encontra o torture porn e o gore, mas é exibida de modo tão competente que o desgosto pelo que está em tela é mais desagradável que muitos outros trabalhos do gênero, ao ponto de ser tornar em uma segunda metade de filme de horror.

A criatividade em chacinar, decapitar, explodir norte-americanos e japoneses, apresenta-se com a energia inquietante do diretor. A dinâmica entre os dois lados é grandiloquente, já que aponta a sua finalidade de criar uma tensão que seja assustadoramente densa e natural. E isto o diretor consegue com bastante eficácia.

O som e a montagem, neste sentido, trabalham unificadas através da tamanha exposição de pessoas estrondando e sofrendo. O filme cresce e manifesta diversos seguimentos alarmantes de ação, como foi visto no último Mad Max – Estrada da Fúria, em que o diretor causa mais perigo que harmonia. Gibson, em vista disto, traz cores sujas o suficiente para exibir os limites da guerra, o que conduz consigo aquele vermelho de sangue que se destaca em seu enjoo de terror.
Enquanto a sua violência usual se destaca em minutos do último ato, Garfield exibe as suas distintas camadas. Ainda que as suas atitudes heroicas permaneçam fortemente, o personagem é trabalhado pelo roteiro de meio brilhante para que a sua obviedade nunca fique desgastada. Assim como William Wallace verbalizava constantemente sobre a sua imaginável liberdade, Doss é apresentado como um novo audaz, e não necessariamente doce ou amigável, e sim como alguém que tem mais coragem no desespero do que em qualquer outra situação. E Garfield prepara esta tamanha proximidade, já que seu carisma e sequências corporais são alegóricas o bastante para revelarem o seu talento.

Deste modo, Mel Gibson mais uma vez mostra a sua direção arrojada em trabalhar bem com as trivialidades. Enquanto O Resgate do Soldado Ryan de Steven Spielberg dispõe de uma abertura espetacular, Gibson separa o que há de melhor para o final. E, em seu terceiro ato, o diretor se redime depois de tantos erros violentos e opressores que o fizeram se afundar em um limbo vergonhoso. Assim como Doss, o diretor fez arte com os vestígios da violência. 

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