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Rock’n Roll - Por Trás da Fama (2017) | Forever Young

Rock'n Roll - Por Trás Da Fama : Poster
Rock'n Roll (França)
A todo instante dos 123 minutos de ‘Rock’n Roll’ atentei-me ao fato de que se seu protagonismo fosse ocupado por uma mulher que, em mesmos parâmetros, passa por uma crise profissional por conta da idade, este jamais seria um filme de comédia. Isso porquê o principal drama do personagem Guillaume (homônimo de seu autor/ator) não se volta ao fato de ter sua carreira inviabilizada devido seus 40 e poucos anos. O que o incomoda são os tipos de papeis que enfrentará daí para frente, percebendo que a indústria quer tanto lhe reclassificar.

É por isso que o filme “autobiográfico” do astro Guillaume Canet é uma comédia; no fim das contas, é uma história que fala sobre ego e a percepção da própria imagem de acordo com as insistências do tempo. A mulher nessa indústria, porém, perde papéis, tem a carreira ameaçada. Esse ano, por exemplo, o fato da atriz Nicole Kidman apresentar quatro filmes no Festival de Cannes foi retratado em diversas matérias sensacionalistas como uma grande conquista por ter a idade que tem. É uma situação a se discutir, e Guillaume flerta com isso numa brincadeira inacreditavelmente divertida.

Os personagens de 'Rock’n Roll' são ficcionalmente reais; Guillaume e Marion Cotillard da vida real formam um casal de verossimilhança bizarra – e é ainda mais engraçado visto pela percepção que são caricaturas da própria realidade. E dessa linha entre o que é propriamente real e do que se extrapola, surge o discurso preciso sobre o mercado da imagem. Por compreender que o problema do ator de meia-idade não é precisamente profissional, Guillaume constrói uma história por cima dessa inquietação com a juventude. Não há a vitimização masculina dramática para além disso, e a obra acaba chegando em terrenos maiores desse impasse. Marion é também afetada pela crise, mas sua redução na estrutura do roteiro é tão significativa quanto ridícula – seu sofrimento lacônico unido a adaptação do marido forma esse pequeníssimo debate, ainda mais ao sugerir a trajetória mecânica e “feliz” da excedência entre indústrias. A juventude parece caber muito mais na América do que na Europa, e tudo condiz a essa conversa, como a distinção entre o filme “profundamente dramático” que Guillaume filma na França e a deformação enérgica produzida no outro continente. 

Por essas inquietações, é uma surpresa que a partir de certo momento o filme invalide todas as expectativas possíveis. Guillaume se molda ao que acreditar ser a demanda de sua indústria interna e o filme, a partir de então, torna-se tão bizarro quanto sua aventura. É claro que por esse caminho o filme inevitavelmente se esculacha; mesmo que tenha a completa consciência disso, o processo do que critica se torna entediante. É parte de sua verossimilhança que cause esse transtorno em quem o assiste, já que não é imaginável que essa história vá acabar como ela resolve acabar – é uma contramão que seria frustrante se não houvesse a auto exploração de quem o cria. 

Seu humor é constantemente recriado para dar conta de tons tão distintos, e é revigorante perceber que os lugares-comuns não são buscados em nenhum momento. Quando a trama se torna estranha o suficiente e a narrativa começa a abusar de seu novo humor, é igualmente engraçado e desconfortável que o filme não saiba mais no que se tornou. De repente, é tudo confuso, bagunçado e inacreditável. 

‘Rock’n Roll – Por Trás da Fama’ é uma história que diverte até mesmo quando cansa. Não é um mérito grandioso que o filme precise se perder para escrachar a crise labiríntica na qual se enfia, mas é suficiente ao que propõe. Sem medidas certas ou regras do gênero que se intitula, uma obra que tem como principal destaque de engate e de incômodo sua insanidade – uma jornada que perde pé e cabeça sem ponderar o ridículo. É tudo muito arriscado, mas Guillaume sabe até onde essa loucura é sustentável.


Crítica: Rock’n Roll – Por Trás da Fama (2017)

Forever Young


/ Filme assistido no Festival Varilux de Cinema Francês 2017 /

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