Rock'n Roll (França) |
É por isso que o filme “autobiográfico” do astro Guillaume Canet é uma comédia; no fim das contas, é uma história que fala sobre ego e a percepção da própria imagem de acordo com as insistências do tempo. A mulher nessa indústria, porém, perde papéis, tem a carreira ameaçada. Esse ano, por exemplo, o fato da atriz Nicole Kidman apresentar quatro filmes no Festival de Cannes foi retratado em diversas matérias sensacionalistas como uma grande conquista por ter a idade que tem. É uma situação a se discutir, e Guillaume flerta com isso numa brincadeira inacreditavelmente divertida.
Os personagens de 'Rock’n Roll' são ficcionalmente reais; Guillaume e Marion Cotillard da vida real formam um casal de verossimilhança bizarra – e é ainda mais engraçado visto pela percepção que são caricaturas da própria realidade. E dessa linha entre o que é propriamente real e do que se extrapola, surge o discurso preciso sobre o mercado da imagem. Por compreender que o problema do ator de meia-idade não é precisamente profissional, Guillaume constrói uma história por cima dessa inquietação com a juventude. Não há a vitimização masculina dramática para além disso, e a obra acaba chegando em terrenos maiores desse impasse. Marion é também afetada pela crise, mas sua redução na estrutura do roteiro é tão significativa quanto ridícula – seu sofrimento lacônico unido a adaptação do marido forma esse pequeníssimo debate, ainda mais ao sugerir a trajetória mecânica e “feliz” da excedência entre indústrias. A juventude parece caber muito mais na América do que na Europa, e tudo condiz a essa conversa, como a distinção entre o filme “profundamente dramático” que Guillaume filma na França e a deformação enérgica produzida no outro continente.
Por essas inquietações, é uma surpresa que a partir de certo momento o filme invalide todas as expectativas possíveis. Guillaume se molda ao que acreditar ser a demanda de sua indústria interna e o filme, a partir de então, torna-se tão bizarro quanto sua aventura. É claro que por esse caminho o filme inevitavelmente se esculacha; mesmo que tenha a completa consciência disso, o processo do que critica se torna entediante. É parte de sua verossimilhança que cause esse transtorno em quem o assiste, já que não é imaginável que essa história vá acabar como ela resolve acabar – é uma contramão que seria frustrante se não houvesse a auto exploração de quem o cria.
Seu humor é constantemente recriado para dar conta de tons tão distintos, e é revigorante perceber que os lugares-comuns não são buscados em nenhum momento. Quando a trama se torna estranha o suficiente e a narrativa começa a abusar de seu novo humor, é igualmente engraçado e desconfortável que o filme não saiba mais no que se tornou. De repente, é tudo confuso, bagunçado e inacreditável.
‘Rock’n Roll – Por Trás da Fama’ é uma história que diverte até mesmo quando cansa. Não é um mérito grandioso que o filme precise se perder para escrachar a crise labiríntica na qual se enfia, mas é suficiente ao que propõe. Sem medidas certas ou regras do gênero que se intitula, uma obra que tem como principal destaque de engate e de incômodo sua insanidade – uma jornada que perde pé e cabeça sem ponderar o ridículo. É tudo muito arriscado, mas Guillaume sabe até onde essa loucura é sustentável.
Forever Young
/ Filme assistido no Festival Varilux de Cinema Francês 2017 /
Comentários
Postar um comentário
Deixe sua opinião!