Após
um período de muita expectativa e especulação – nem sempre positiva –, Death
Note, adaptação norte-americana da série de mangás homônima de Tsugumi Ohba e Takeshi Obata, chega à Netflix com roupagem ocidental, estética
particular e personagens familiares, mas nada além disso.
Dirigido
por Adam Wingard, o longa se passa
em Seattle e conta a
história de Light Turner (Nat Wolff),
um jovem estudante que, ao encontrar um caderno sobrenatural, recebe o poder de
matar qualquer pessoa apenas em posse de duas informações: o nome e o rosto da
vítima. Após chamar a atenção de L (Keith
Stanfield), um experiente detetive de hábitos excêntricos, Light se vê
encurralado e luta para permanecer sobre o controle de suas novas
possibilidades.
Talvez
pela bagagem anterior de Wingard – o diretor possui em seu currículo o recente A Bruxa de Blair (2016), o elogiado Você é o Próximo (2013) e o controverso V/H/S (2012) – algumas cenas chamam
atenção pelas referências diretas a inúmeros subgêneros do terror. E convencem.
Não pela atmosfera, mas exclusivamente pelo seu valor estético.
Dito
isso, precisamos voltar a atenção para um aspecto que permeia todos os defeitos
subsequentes em Death Note: os elementos visuais têm potencial, mas são
completamente atropelados por uma narrativa insegura, desconforme e
incomodamente acelerada.
Em
uma sequência com menos de dois minutos, por exemplo, o ritmo dos
acontecimentos parece querer incutir no público todas as consequências e
implicações sociais de Light ter encontrado o caderno. Algo que – apenas
por decisão do filme, é bom lembrar – tem total importância para justificar uma
das interações de Light com L dali a pouco.
Mas
nenhum elemento do longa é tão prejudicado pela pressa desmedida quanto a
construção dos personagens. E, em uma adaptação tão audaz como a que o Death
Note americano se propôs a apresentar, com tal distanciamento do material
fonte, o desenvolvimento de cada persona é, no mínimo, primordial.
Aqui,
temos um Light que sofre situações de injustiça, é reativo a elas, mas não sabe
– ou, pelo menos, não demonstra saber – o que fazer na maior parte do tempo
útil em tela. Os caminhos narrativos sobre esse personagem são dúbios: ficamos
sabendo que Light não é vaidoso sobre seu poder, mas, por vezes, não faz tanta
questão de escondê-lo. Além disso, a atuação de Nat Wolff é tão relapsa que
desconcentra o público.
Já
L não deixa tanto a desejar. Keith Stanfield está bem em cena, e algumas
escolhas do filme relativas à sua postura corporal trazem boas lembranças aos
fãs sobre a obra original. Mas o contentamento não dura muito: apesar de ser
tratada como um fato indiscutível pela narrativa, a inteligência do personagem
– que deveria ser, de longe, o seu ponto forte – é questionável. L teria outros
meios para chegar até Light que não fossem coincidências de roteiro.
O
irreverente deus da morte Ryuk (Willem
Dafoe) também trouxe novidades: sem maiores revelações da trama, basta
dizer que, aqui, ele não é passivo sobre a utilização do caderno por humanos.
Em outras palavras, ele é menos observador do que manipulador. Porém, o visual
pouco realista do personagem – quase sempre escondido por desfoques de câmera
ou sombras injustificadas – não faz jus ao bom trabalho de voz de Dafoe.
A
jovial Misa Amane, por sua vez, foi adaptada para Mia Sutton (Margaret Qualley) no live action, uma estudante
assim como Light. Apesar de ser cúmplice do protagonista durante toda a trama,
o que é bastante interessante de se ver, o tom da personagem nunca é
consistente, o que faz de sua participação uma confusão do início ao fim.
Quanto
aos outros fatores, esse é um daqueles filmes que nos lembram de que, quando a
narrativa é superficial, os aspectos técnicos ficam à deriva. Exemplo disso é o
ousado tom cyberpunk da cinematografia e os enquadramentos incomuns.
Ambos são bonitos, mas, com tantas inconsistências de roteiro e direção, só têm
a nos avisar que estão em tela a serviço de nada.
Por
fim, é inevitável perceber que Death Note faz de si um paradoxo: por não
ser mais que um conjunto de cenas pouco amarradas entre si, a história não
caminha muito bem sem a memória da obra original como pano de fundo. E, ainda
assim, na medida em que pede auxílio às lembranças do espectador, entrega de
bandeja a ele os próprios defeitos.
Comentários
Postar um comentário
Deixe sua opinião!