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Mãe! (2017) | O apocalipse é o agora


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Vaias e aplausos: essas foram as primeiras reações ao novo filme de Darren Aronofsky. Essa é uma das principais evidências de que Mãe! não é passível de indiferença do público. Ele vai te fazer pensar e querer formar uma opinião sobre. Mas nada de imediatismo. O que o diretor propõe em seu longa é tão intenso, que são necessárias algumas horas – ou dias – para digerir o que foi visto. Por isso, não espere que essa crítica seja definitiva. Mãe! é, certamente, um filme para se extrair algo novo toda vez que for assistido.

Aronofsky não é tímido em externar as suas referências e inspirações. Mãe! possui elementos em sua narrativa que lembram propositalmente o terror de Roman Polanski, O Bebê de Rosemary (1969). A mulher que presta o seu papel social de esposa atenciosa, os vizinhos intrusos, o confinamento e o mistério são alguns desses elementos em comum. Não à toa, o pôster de divulgação homenageou o clássico. Porém, mais do que isso, o diretor (e também roteirista) se baseou em uma história que todos conhecemos. Talvez, a história mais conhecida de todos os tempos.

Ora terror, ora suspense, mas sempre horror psicológico. Mãe! é desenvolvido e argumentado na experiência dentro e fora da sala de cinema. A intensidade em cada sequência é concebida pela harmonia perfeita entre atuação, técnica e direção. O roteiro, que possui um ritmo descontínuo, não deixa de aproveitar, porém, cada momento para desenvolver seus personagens. A própria trilha, muito discreta, dá atenção aos detalhes sonoros.

Aronofsky, que já conseguiu garantir um Oscar para Natalie Portman por Cisne Negro (2010), não deixa a desejar na direção de atores. Ele assina a obra com seu estilo de direção, de planos fechados, com câmera instável, absorvendo todo o talento de Jennifer Lawrence e de Javier Barden. Esta primeira está, sem dúvidas, empenhada em fazer o público sentir o que sua personagem sente, e, mesmo com os poucos diálogos, expressa de forma visceral o mais íntimo do seu papel. Provavelmente a melhor performance da atriz.

O principal recurso narrativo está no simbolismo e na linguagem intersemiótica. A literalidade minimizada pode fazer alguns classificarem o filme como surrealista, sobretudo em sua sequência final. Mas, a partir daquele momento, a tela se torna uma janela para o mundo real. Feminicídio, fanatismo religioso, abuso de poder e muitos assuntos que percorrem as notícias do mundo são trazidas à tona de forma inesperada e latente. A sucessão de acontecimentos em um pequeno limite de espaço faz o Mãe! parecer um exagero cinematográfico, quando, na verdade, consagra violenta e perturbadoramente uma realidade da qual não estamos preparados para aceitar enquanto sociedade. Dito isto, em uma sociedade estigmatizada com valores sociais deturpados, é quase involuntário haver resistência. Por isso as vaias.

Mãe! é um dos filmes mais ousados do século XXI, que beira a presunção e a vaidade. Se apropriar de questões delicadas pode parecer, ao olhar de muitos, uma oportunidade para perpetuar o filme e o nome do seu conceptor. No entanto, Aronofsky traz a sua visão de caos, do apocalipse e do que somos. Se o seu objetivo era nos fazer questionar sobre as circunstâncias humanas e sociais, ele consegue; e se utilizar do cinema para isso é um mérito que poucos alcançam. E após tantas deliberações sobre esse filme, só resta uma pergunta: a vida imita a arte ou a arte imita a vida?

Crítica: Mãe! (2017)

O apocalipse é o agora

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