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A Favorita (2019) | Yorgos Lanthimos se vende à indústria da melhor forma possível


Dirigido por Yorgos Lanthimos, o mesmo de A Lagosta, A Favorita é um filme que retrata a história real da frágil Rainha Anne, que ocupa o trono da Inglaterra e tem um caso com a sua amiga mais próxima, a Lady Marlborough, que, em determinadas situações, governa a nação em seu lugar. Tudo muda quando uma nova serva chega ao palácio e põe em risco a relação da rainha e da lady. Em outras palavras: temos aqui um triangulo amoroso lésbico e que, graças ao roteiro e seu elenco primoroso, nunca deixa de ser um drama sobre dores e manipulações.

É notório e fácil de se apontar que poucos diretores do cinema contemporâneo conseguem realizar a proeza de filmarem obras singulares, ainda que estranhamente sádicas. Lanthimos surge nessa com uma tarefa tão difícil quanto os seus filmes anteriores. Em A Favorita, o diretor nos diverte, conta a história das três personagens e ainda desenvolve um humor negro difícil de aceitar, mas fácil em gerar o riso. Essa camada do roteiro, por sinal, só é feita com tamanha perfeição graças ao elenco, que tem uma Rachel Weisz cada vez mais imponente, Olivia Colman, sendo a grande “favorita” ao Oscar (depois de Glenn Close) e Emma Stone, que, apesar de ser o saco de pancadas do filme, nunca abaixa a cabeça diante de sua inimiga.

Apesar dos elogios, A Favorita não é um filme fácil. Além de ser o mais diferente entre todos os indicados ao Oscar de melhor filme, o longa conta com uma excentricidade que sai do casual para o bizarro em questão de poucos segundos. Isso se deve a fotografia de Robbie Ryan, que oferece técnicas para criar um universo crível e distorcido. Através da lente “olho-de-peixe”, o fotografo traz realismo, ao mesmo tempo que desenvolve opressão e desconforto, visto que aquele palácio, apesar de enorme, fica cada vez menor para o trio de mulheres. O mesmo pode ser dito sobre a direção de arte e figurino, que são clássicos e vistosos o suficiente para encher os olhos. É um deleite visual que gera realismo e nos faz entrar no universo de manipulações.

Mas, as donas do filme, de fato, são as personagens Sarah e Abigail, que possuem uma química tão intensa quanto a de Whiplash: Em Busca da Perfeição, que trazia uma guerra psicológica entre os personagens. Aqui, as duas parecem sempre estar um passo à frente da outra, e, nesse jogo de poder, o filme fica intrigante desde o primeiro até o último contato das duas mulheres. Simplesmente não sabemos por quem torcer. E isso é consideravelmente importante para uma obra sobre embates de poder.

Poder, por sinal, pode ser o grande antagonista da obra. Lanthimos retorna a um pensamento de que guerra, sexo e dinheiro comandam todas as cabeças, como podemos observar com o personagem de Nicholas Hoult, que, acima de tudo, deseja ser alguém importante na corte. Nesse sentido, A Favorita surge como um estudo da psiquê humana em meio à guerra sexual e como, infelizmente, a loucura toma conta do poder. Independente de nação ou sexo, a insanidade, apesar de podre, sempre vence. É o exemplo perfeito de que a arte, de fato, imita a vida. Ou vice-versa.

Crítica: A Favorita (2019)

Yorgos Lanthimos se vende à indústria da melhor forma possível

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