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Dumbo (2019) | Bela produção, falha no roteiro

As cores escuras e frias, o exótico e o bizarro, a narrativa excêntrica e a presença constante do onírico. Não é difícil supor que estamos diante de um filme do diretor Tim Burton, conhecido por diversos outros filmes consagrados pelo público e pela crítica, como Edward, mãos de tesoura (1990), A Noiva-Cadáver (2005) e Sweeney Todd: O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet (2007). Em 2019, o diretor, que há alguns anos andava sumido das grandes bilheterias, arrisca junto à Disney na produção live-action do polêmico clássico de 1940: Dumbo.

Nesta versão, em um 3D completamente desnecessário, o elefantinho voador das grandes orelhas não anda com animais falantes e consegue manter o protagonismo, mesmo dividindo a tela com elenco de peso. Os créditos, entretanto, não devem ser somente aos animadores, que fizeram um bom trabalho com a construção digital de Dumbo e sua mãe, mas sim pelo roteiro, que não faz jus aos grandes nomes. Entre eles, Michael Keaton - versão bizarra e caricaturada de um padrão do diretor -,  Colin Farrel - o herói da trama, mas que acaba superficial e com carga dramática desnecessária -Eva Green - trapezista que ganha destaque do meio para o final, sem motivo realmente aparente - e duas crianças que entregam performances sóbrias demais para seus personagens, mas que fazem o bom trabalho de motivar grande parte dos acontecimentos do longa. Danny DeVito talvez seja uma das poucas exceções, pois, mesmo preso a um esteriótipo - a do alívio cômico -, entrega uma boa atuação e arranca umas boas risadas, o que alivia a tensão presente em todo o filme. Além desses, são diversos outros personagens que surgem e somem quando conveniente ao roteiro. 

A aceitação e a mensagem contra o bullying já não são mais os pilares da trama, mas sim sobre os maus-tratos de animais em circos e seu uso para o entretenimento em geral, o que é ótima ideia considerando o avanço mundial dessa tendência, apesar de um pouco atrasado. A produção, contudo, foca mais nos elementos visuais que no roteiro, o que diminui a qualidade da história, mas de fato garante visões bonitas através de uma paleta de cores harmoniosa. A busca de Dumbo pela Sra. Jumbo, sua mãe, fica em segundo plano. Já as histórias avulsas da família Farrel nem chega a isso. 

Burton consegue reproduzir a bizarrice de algumas animações antigas, como a cena em que Dumbo assiste um show de elefantes de sabão. Assim como na animação, a produção live-action acerta na bizarrice, apesar de, na minha opinião, ter sido uma experiência levemente perturbadora. Neste sentido, prefiro que o diretor fique longe de qualquer produção nova de Pinóquio. Imagina a cena em que o boneco de madeira se transforma em burro? Eu mesma não superei esse trauma, e aposto que muitos outros das gerações antes dos anos 2000 também não.

Dumbo é, de fato, um filme bonito. Mantém o equilíbrio nas cores e constrói visões, principalmente noturnas, com boa técnica. Mas a história que contempla todo esse visual prefere ficar na zona de conforto e entrega uma produção na média, mas não consegue sair dela. É um filme decente. E só. Não possui a dinamicidade da Bela e a Fera (2017), a inovação relevante de Cinderella (2015) ou a grandiosidade de Mogli (2016). Dumbo se mantém no mesmo nível que Alice no País das Maravilhas (2010), que, coincidentemente (ou não) é do mesmo diretor. Por meio disto, faz sentido que Dumbo seja um live-action remake da Disney menos rentável em sua estreia (até agora).

+ A Bela e a Fera (2017) | A nostalgia em carne, osso e computação

+ Mogli - O Menino Lobo (2016) | Nasce um jovem clássico

Remakes de live-action podem ser ótimas ideias, ou terríveis. O exagero do 3D e a grande quantidade em pouco tempo não ajuda tanto a promover a nostalgia que deveria ser o foco. No final, se torna literalmente só mais uma no grande leque de filmes da Disney e que acabará se perdendo diante de tantos longas incríveis da produtora.


Crítica: Dumbo (2019)

Bela produção, falha no roteiro

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