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Cidadão Instigado - Uhuuu!: Dez anos do disco que marca a viagem entre o experimentalismo e brega romântico

Cidadão Instigado não é pra todo mundo. A cada disco colocado na praça, a banda vai se aproximando mais e mais da estética psicodélica pensada por Fernando Catatau, que sempre flertou com o rock pinkfloydiano unido ao brega clássico nordestino. Provando a estranheza de quem o escutava, os ouvintes entravam em clima de experimentação, dualizando com a essência de uma droga alucinógena entrando no sangue de todo mundo, passando pelo desconhecido, encontrando a sua essência, se entregando ao que é dito. 

Já em 2009, depois da picardia de O Ciclo da Dê-Cadência (2002) e da pegada brega de O Método Túfo de Experiências (2005), o disco Uhuuu!, considerado por muitos como o melhor trabalho da banda, entrava em cena. Tudo voltava, sendo que de uma forma mais palatável, onde o autor criava um exercício de ressignificar o pop nas diluídas batidas que misturam, com o apoio de um groove, o funk e jazz. 

Cidadão Instigado - Uhuuu!: Dez anos do disco que marca a viagem entre o experimentalismo e brega romântico

  CRÍTICA  


Aqui, o que a banda buscou, e que envelheceu bem com o tempo, diga-se de passagem, foi um novo sentido de naturalidade. Ainda que tivesse um pé flertando com códigos da música melancólica, o grupo fez com que a sonoridade de Uhuuu! estivesse bem mais próxima daquela que a produz ao vivo, o que, felizmente, permite que os arranjos se sintam livres para pontuar músicas com elementos experimentais.

Esse clima fica evidente em faixas como "Dói", por exemplo, em que versos como "Mesmo que falte a coragem/ Ou sobrem.../ Sobrem palavras tolas/ A gente pode rir/ Ou até mesmo chorar" não são cantados, mas articulados com uma tristeza barulhenta originada do órgão sobrenatural e da guitarra de Catatau. É um som que nos faz sentir em sua voz as feridas abertas que o tempo lhe fez. É o mal-estar recompensado no rock, diferente do som da geração coca-cola da década anterior, mais concentrada em pintar o próprio nariz de palhaço do que entender suas dores. 

Acompanhado dos parceiros Regis Damasceno (guitarra e violão), Rian Batista (baixo) e Clayton Martin (bateria), Catatau canta com vontade de estudar algumas paixões, dores, saudades, rotinas, a vida e o amor. A diferença, no entanto, é a harmonia chamativa que o disco tem, próxima do Ventura dos Los Hermanos, que engana a dor do término através de um samba. Se O Ciclo da De.Cadência e O Método Tufo de Experiências (2005) eram obras da noite, Uhuuu! é do dia e da praia, mas lembrando sempre “que o sol está aí para nos queimar”, como diz o refrão da quinta música do álbum, “Escolher Pra Quê?”. Dói, mas é bom. 

Uhuuu! é mais fácil e não ofende os desavisados. É a grande mudança da banda que entende que sofrer também pode ser bom. Aprendemos com isso nos últimos 10 anos?

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