The Legend of Tarzan (EUA) |
Criado por Edgar Rice Burroughs, o personagem conheceu seu auge nas telas na década de 30, com uma série de filmes que traziam Johnny Weissmuller e seu inesquecível grito povoando o imaginário popular. Com trajes sumários, desbravava as selvas ao lado da doce Jane.
Na versão dirigida por David Yates (Harry Potter), temos na sequência inicial o encontro dos dois maiores inimigos de nosso herói. O primeiro, Mbonga (Djimon Hounsou), tem como justificativa a vingança pela morte do filho durante uma cerimônia de iniciação. Leon Rom (Christoph Waltz) tem motivos menos nobres: buscando reconhecimento e dinheiro, aceita a proposta de Mbonga para que traga Tarzan para ele. Tarzan é um aristocrata totalmente adaptado à sua nova vida em Londres. Atendendo como John Clayton III, o Lorde de Greystoke, tem uma vida tranquila ao lado de Jane. Enviado como missionário do rei para o Congo, na verdade é uma vítima de um complô que visa sua captura em troca de diamantes.
Um dos grandes problemas que rondam o cinema atual é a já conhecida falta de criatividade de muitos roteiros, que volta e meia retornam a antigos sucessos, recontando as histórias e criando as origens das mesmas. Outro filão são as intermináveis sequências, com narrativas poucas vezes atraentes para os novos públicos. E dentre as maiores inconsistências desse filme está o roteiro, escrito por Adam Cozad e Craig Brewer, que teve se virar para explicar tantos furos através de intermináveis flashbacks.
Eles surgem em todo momento, mostrando a necessidade de explicar as origens do homem que foi criado entre macacos, mostrando as referências já conhecidas de todos: o abandono em meio à selva, o momento em que conheceu Jane e os vínculos de amizade criados entre o simpático povo que vive às margens da sociedade e o homem branco que perdeu os pais precocemente. Esse elemento da narrativa, quando bem utilizado, torna-se uma excelente ferramenta para explicar o porquê de algumas ações no presente. Mas não é o caso aqui. O intenso vai e volta prejudica as sequências tornando tudo cansativo para o espectador. Outro ponto fraco é o uso do 3D, que favorece alguns filmes de ação e animação, mas que se torna extremamente dispensável tendo em vista a belíssima fotografia e efeitos especiais utilizados.
Christoph Waltz já provou há tempos ser um dos atores mais versáteis, mas muitas vezes subutilizado e repetindo os mesmos vilões em diferentes projetos. Samuel L. Jackson, o queridinho de Quentin Tarantino, se torna o maior destaque da trama trazendo com seu George Washington Williams (personagem baseado em um ativista de direitos humanos afro-americano) o tom cômico à trama, não tendo medo de demonstrar sua fragilidade e ignorância frente a um mundo desconhecido.
Maggie Robbie fecha o trio dos secundários, com sua desbocada heroína Jane. Ela permanece em constante perigo (sim, mais uma vez ela é sequestrada), mas é forte e corajosa o suficiente para encarar um rio repleto de hipopótamos famintos e renegar o vilão Leon Rom em suas investidas. Alexander Skarsgård (True Blood) surge com uma boa forma inversamente proporcional à expressividade, trazendo um Tarzan totalmente inexpressivo, até mesmo nas lutas. A desculpa de que Tarzan exige uma atuação contida talvez sirva de consolo para seus mais ardorosos defensores, mas a sua falta de expressão tornaria difícil a comunicação até mesmo com os animais, a tão citada virtude do personagem.
A mensagem principal já trazida desde o princípio continua sendo a mesma: o homem é entre todos os animais o mais estúpido e irracional. Suas brigas motivadas pela ganância destoam do poder da natureza, que tem suas próprias regras. Mas Tarzan permanece sendo o homem branco de olhos claros que com sua nobreza se transforma no rei de todos. Aqui há a repetição dos velhos clichês de uma história baseada no colonialismo e que ignora à fundo as questões raciais, preferindo dividir as tribos entre colonizados e selvagens.
O filme de David Yates poderia dar uma contribuição à história com os olhos atualizados sobre as questões que hoje vemos de uma forma diferenciada de quando o personagem foi criado. O colonialismo continua sendo visto de maneira condescendente, já que a única tribo que vemos tratar bem à todos é aquela que foi domesticada pelos brancos. Com um enredo superficial, ficamos com uma visão rasa de um homem que deveria ousar mais e demonstrar seu caráter livre, mas vê-se amarrado sob os laços da civilidade.
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