[Várias tentativas. Fecha computador, abre computador, escreve, apaga, edita. Escrever o texto foi difícil, mas começá-lo foi quase impossível]
A audácia de Michael Haneke (diretor austríaco conhecido por filmes como “Caché” [2005], “A Fita Branca” [2009] e por ter ganho o Oscar em Melhor Filme Estrangeiro por "Amor", em 2013) de redigir o roteiro e dirigir o filme “Violência Gratuita” (1997) já traz polêmica desde seu título (“Funny Games”, ou "Jogos Divertidos", em tradução livre) até sua temática, que demonstra cenas de violências que ultrapassam os limites da racionalidade. Entretanto, Haneke foi ainda mais longe ao dirigir, 10 anos depois, uma co-produção norte-americana do longa. Com cenas idênticas, diálogos similares, muita coragem e até quase a mesma duração, o diretor arriscou banalizar a obra ao realizar a refilmagem de um filme de sua própria autoria. “Violência Gratuita” (2007) traz diversas discussões e comparações, principalmente pela sua temática similar ao clássico de Kubrick, "Laranja Mecânica" (1972).
O título, de fato, já é instigante. Quando uma família resolve passar alguns dias em uma casa de veraneio, dois jovens a enxergam como a oportunidade perfeita para saciar seus desejos sádicos e perturbadores. Sem nenhum motivo explícito ou pelo menos racional, Paul (Michael Pitt) e Peter (Brady Corbet) impõem uma situação de controle ao realizar aposta contra a família: eles não permaneceriam vivos nas próximas 12 horas.
Dissertando sobre o instinto selvagem que pode (ou não) se encontrar inerente ao ser-humano, o diretor quebra a quarta parede do cinema; aquela imaginária entre o público e a obra, em que Haneke aplica uma jogada de mestre entre as poucas de seu filme. Ao fazer a personagem Paul não só olhar, mas conversar com o telespectador, nos tornamos mais do que somente observadores passivos, mas testemunhas e até cúmplices do crime bárbaro que ocorre em cena. E o mais, assustador: ao que parece, a ideia é nos fazer gostar disso.
O pensador Hobbes já afirmava que o ser humano é naturalmente mau e que não deseja interações sociais, e é isto que nos perguntamos ao terminar o filme e ao observamos na primeira fila o "prazer" que ambos os jovens parecem sentir ao realizarem tamanha brutalidade. O filme ainda por cima faz questão de esconder quase todas as cenas de violência "significativas", o que só aumenta a curiosidade sádica do telespectador, se é que a teoria se concretiza.
Entretanto, o simples fato da refilmagem parecer não ser algo a mais do que uma certa vaidade do diretor, além da "violência por violência", fazem com que meu conceito sobre o filme diminua ainda mais, considerando a temática bárbara. O famoso "espreme que sai sangue" é não só presente no filme, como parece ser o único conceito trabalhado. As reflexões que poderiam acontecer além do mostrado explicitamente acabam por se esconder entre algumas brechas e em pequenos momentos do filme, sendo ofuscadas por sequências brutas, que expõem a sede irracional do ser humano por cenas de barbaridade e o sentimento sádico que muitos acabam por carregar.
Mesmo assim, é inegável a potencialidade do filme em ao menos gerar uma discussão da sociedade contemporânea (sem falar do fato que este já se tornou símbolo cult, e com certa razão). Porém, a violência em que fui submetida, mesmo avisada pelo título explícito, já fogem do meu próprio senso comum, tirando-me de minha zona de conforto. Não tenho vergonha em dizer que não estou pronta (ou pelo menos não tão pronta assim) para ser invadida, mesmo que cinematograficamente, de forma tão... Cruel.
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