Pela engenhosidade em sua criativa escrita, que posteriormente a traria o título de “Rainha do Crime”, Agatha Christie é uma das escritoras mais populares da literatura universal, atravessando gerações com seus personagens atraentes e instigantes. O sucesso de um de seus volumes, Assassinato no Expresso Oriente, renderia a ele algumas adaptações relevantes no cinema e televisão, sendo talvez a de 1974 a mais famosa (com um estrelado elenco que inclui Albert Finney, Lauren Bacall e Ingrid Bergman, o longa trouxe a esta última seu terceiro Oscar) e um episódio de 2010 do seriado Agatha Christie’s Poirot (produzido por 24 anos, o programa seguia o famoso personagem da escritora por diversos de seus romances, sendo exibido no Brasil pelo canal Multishow), com Jessica Chastain e Hugh Bonneville (de Downton Abbey), a mais recente até então.
Eis que, em 2017, o multifacetado Kenneth Branagh lança um Hercule Poirot para chamar de seu. Além de dirigir e estrelar uma nova adaptação de “Expresso Oriente”, ele também a produz (junto a um time que inclui o renomado Ridley Scott) e, reunindo um elenco de populares personalidades do universo cinematográfico — o que de fato a história-base “exige” —, traz sua visão do personagem à tona, com a esperança de manter-se memorável nas telonas pelos próximos anos, visto que fez questão de deixar em aberto muitas possibilidades para futuras sequências (intuito que concretizou-se com Morte no Nilo sendo anunciado como continuação pouquíssimo tempo após o lançamento do filme no exterior).
O roteiro de Michael Green (por trás de muitos sucessos deste ano, como Logan, Blade Runner 2049 e o seriado American Gods) tenta manter alguns elementos importantes do quebra-cabeça original: Poirot, famoso detetive por desvendar casos que aparentam ser impossíveis, encontra-se a bordo de um trem quando, em meio a uma tempestade de neve, um dos passageiros é assassinado e todos os outros são suspeitos.
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Apesar de preservar as principais pistas e situações, o filme tenta diferenciar-se do livro e de outras adaptações ao alterar características de alguns personagens, tais como personalidade (uma escolha arriscada), etnia, faixa etária e nacionalidade; há, inclusive, personas do livro que em tela fundem-se em um só nome e rosto. Isto não é, de fato, um problema, pois é perceptível o interesse dos realizadores em abordar o preconceito (tema levemente pincelado no livro) de forma que se adeque ao público contemporâneo.
Entretanto, o longa-metragem apresenta, sim, algumas escolhas equívocas: utilizando-se de uma desnecessária sequência introdutória e de alguns flashbacks estilizados de forma cafona, as ações e diálogos beiram ao auto explicativo, para garantir que o público de fato entenda tudo o que está sendo apresentado. Existem também tentativas de inserir um humor desnecessário e fora de tom, resultando em uma produção com picos disformes dentro do seu propósito.
Apesar de preservar as principais pistas e situações, o filme tenta diferenciar-se do livro e de outras adaptações ao alterar características de alguns personagens, tais como personalidade (uma escolha arriscada), etnia, faixa etária e nacionalidade; há, inclusive, personas do livro que em tela fundem-se em um só nome e rosto. Isto não é, de fato, um problema, pois é perceptível o interesse dos realizadores em abordar o preconceito (tema levemente pincelado no livro) de forma que se adeque ao público contemporâneo.
Entretanto, o longa-metragem apresenta, sim, algumas escolhas equívocas: utilizando-se de uma desnecessária sequência introdutória e de alguns flashbacks estilizados de forma cafona, as ações e diálogos beiram ao auto explicativo, para garantir que o público de fato entenda tudo o que está sendo apresentado. Existem também tentativas de inserir um humor desnecessário e fora de tom, resultando em uma produção com picos disformes dentro do seu propósito.
Crítica: Assassinato no Expresso Oriente (2017)
Belas paisagens, muita turbulência
Por dividir sua atenção entre muitos aspectos deste filme, Branagh talvez tenha se perdido em sua interpretação; inicialmente evocando uma excentricidade que ecoa dos modernos Sherlock Holmes (Tanto no de Robert Downey Jr. quanto no de Benedict Cumberbatch), seu desempenho de cão farejador com TOC tenta forjar carisma e só consegue atingir uma dimensão mais impactante e verossímil com a aproximação do ato final. Como diretor, no entanto, ele apresenta um eficiente formalismo do qual já assumira, tanto em filmes recentes, como Cinderela (2015), quanto em clássicos, como Hamlet (1996).
O grandioso elenco mescla veteranos, como Judi Dench, Derek Jacobi e Michelle Pfeiffer; marcantes, como Penélope Cruz e Willem Dafoe, e populares, como Daily Ridley, Josh Gad e Leslie Odom Jr. Até o cínico Johnny Depp conseguiu um (felizmente temporário) lugar no trem, mesmo como um gângster que mais lembre o seu Lobo Mau de Into the Woods (2014). Embora todos tenham pouco tempo em tela para brilhar, quase todos o alcançam, principalmente Pfeiffer, Gad e Cruz. Ridley e Odom Jr, que estão em ascensão, ainda possuem pouca filmografia no currículo, mas surpreendem e esbanjam carisma.
Dentre os aspectos que triunfam positivamente, muitos estão relacionados ao visual desta adaptação. Além dos bons efeitos visuais e do design de produção primoroso, Branagh traz alguns de seus melhores colaboradores prévios para a equipe; o fotógrafo Haris Zambarloukos (com quem trabalhou em Cinderela e Thor) diverte-se ao explorar diferentes perspectivas, e a figurinista Alexandra Byrne (de Hamlet) brilha com suas criações de época, transpondo a essência de cada personagem em detalhes de seu belíssimo guarda-roupa — um dos melhores pontos do filme, e que provavelmente será lembrado na próxima temporada de premiações.
Este novo reconto de “Expresso Oriente”, dentre seus altos e baixos, entrega uma experiência positiva, mas não necessária. Desafina em alguns momentos, porém mantém-se firme em sua aparência, honra seu conteúdo-base e acerta com seu casting. Peca por carregar tantas expectativas (de leitores e cinéfilos), mas sabe que deve seguir um quociente mínimo de qualidade para manter-se seguro e respeitável, principalmente nas concorridas bilheterias de fim de ano e nos desejáveis prêmios de cinema.
O grandioso elenco mescla veteranos, como Judi Dench, Derek Jacobi e Michelle Pfeiffer; marcantes, como Penélope Cruz e Willem Dafoe, e populares, como Daily Ridley, Josh Gad e Leslie Odom Jr. Até o cínico Johnny Depp conseguiu um (felizmente temporário) lugar no trem, mesmo como um gângster que mais lembre o seu Lobo Mau de Into the Woods (2014). Embora todos tenham pouco tempo em tela para brilhar, quase todos o alcançam, principalmente Pfeiffer, Gad e Cruz. Ridley e Odom Jr, que estão em ascensão, ainda possuem pouca filmografia no currículo, mas surpreendem e esbanjam carisma.
Dentre os aspectos que triunfam positivamente, muitos estão relacionados ao visual desta adaptação. Além dos bons efeitos visuais e do design de produção primoroso, Branagh traz alguns de seus melhores colaboradores prévios para a equipe; o fotógrafo Haris Zambarloukos (com quem trabalhou em Cinderela e Thor) diverte-se ao explorar diferentes perspectivas, e a figurinista Alexandra Byrne (de Hamlet) brilha com suas criações de época, transpondo a essência de cada personagem em detalhes de seu belíssimo guarda-roupa — um dos melhores pontos do filme, e que provavelmente será lembrado na próxima temporada de premiações.
Este novo reconto de “Expresso Oriente”, dentre seus altos e baixos, entrega uma experiência positiva, mas não necessária. Desafina em alguns momentos, porém mantém-se firme em sua aparência, honra seu conteúdo-base e acerta com seu casting. Peca por carregar tantas expectativas (de leitores e cinéfilos), mas sabe que deve seguir um quociente mínimo de qualidade para manter-se seguro e respeitável, principalmente nas concorridas bilheterias de fim de ano e nos desejáveis prêmios de cinema.
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