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28º Cine Ceará: Cobertura da Mostra Olhar do Ceará

Resultado de imagem para Ponte Velha, de Victor de MeloDurante as mostras paralelas à competitiva do 28º Cine Ceará, a Olhar do Ceará é a que cada vez mais vem se aperfeiçoando como um recorte da produção de curtas-metragens cearenses. Tanto produções independentes como originadas das várias escolas de artes do município são exibidas na tela do Cinema do Dragão durante à tarde, sendo seguindo por debate com os realizadores. 

28º Cine Ceará: Cobertura da Mostra Olhar do Ceará

Essa publicação vai sendo atualizada diariamente com novos filmes da Mostra


Pelo segundo ano consecutivo, a curadoria da Mostra é da Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine), e esta edição está dividia em quatro sessões temáticas: Pertencer a um território, Compor um Retrato, Experimentar o artifício e Reinventar as identidades. Esta publicação está sendo atualizada diariamente com comentários sobre os curtas em destaque na mostra que vai até o dia 09 de agosto.

DIA 07/08 - Compor um Retrato


Na segunda sessão da olhar do ceara encontramos com o recorte “retratos”. Os filmes que são escolhidos apartir do mesmo são Eroica, de Josy Macedo; Teto, de Darwin Marinho; Sessão Especial, de Gabriela Queiroz; Maria Maculada, de Bruno Bressam e Leão Neto; 180 Graus, de Tay Moreira; e Virá dos Olhos Teus, de Anderson Damasceno.

Enxergo escolhas óbvias de estarem ali, tão clássicas quanto os curtas a que elas se remetem. Esse clássico se contrapõe a certos filmes que buscam um olhar mais diferente, escolhendo outro viés de forma para se comunicar com o espectador. A minha intriga se baseia justamente nisso, qual é esse recorte se vejo filmes tão equidistantes? Onde está a área cinza? Talvez a área cinza não tenha sido vista justamente pela ordem em que os curtas apareceram. O tema da sessão “retratos”, ora era visto pela lógica da disposição dos curtas, ora era perdido pela vontade de trazer um retrato diferente. 

Do modo como os filmes foram postos, vejo um efeito sanfona de estéticas. Iniciamos com Eroica, um filme com uma ideia que se comunga com a própria estética, tendo um protagonista invisível porém audível por portar osteclerose. No entanto, o curta não consegue ir além disso. Tendo um começo promissor e um final criativo, mas, com um meio do filme (o famoso miolo), que não se faz ansiar pelo desfecho.

Outro filme que vale a pena destacar é Maria Imaculada, ovacionado na sessão. É simples, direto e honesto. Conta, ao estilo de um cinema verité que foi para a correção de cor, a história da tia do diretor só pelo uso da fala da protagonista. Por vezes pensamos que se trata de mais um documentário usual de relatos, onde o sujeito senta-se na frente da câmera e fala de suas vivências. Mas a surpresa é que é exatamente isso, e o filme ainda consegue cativar. A simplicidade da forma deu equilíbrio a uma história complexa, fazendo do filme uma contradição que faz sentido.

DIA 08/08 - Experimentar o Artifício


Finalmente me senti numa mostra do Olhar do Ceará, vi as diferentes vivências e perspectivas de uma Fortaleza e adjacências multifacetadas que não existem sem a cidade, e a cidade se sustenta em seus traquejos. A sessão exibiu o Mergulho dos Pássaros, de Harley Almeida; Presente, de Rodrigo Pedroza; Boca de Loba, de Bárbara Cabeça; Milésima Segunda Noite, de Ariel Volkova e Taís Augusto; Terra Ausente, de Robson Levy; Escafandro, de Carol Morais; e Quando o Mar, de Lua Alencar.

Mergulho dos Pássaros, um filme que poderia muito bem ser inserido na ambiência de uma instalação, pois cada espectador que se aproximasse teria o voo dos pássaros como algo único e novo que encontrou em sua chegada à obra. No ambiente de cinema, a mesma coisa não acontece, pois o espectador de cinema é em sua natureza imóvel, então o foque extenso e incessante do mergulho dos pássaros se torna enfadonho. Presente, um exercício de propagação do som por ambientes vazios. Esse sim é um filme que pertence à sala de cinema, por que precisamos imaginar e recolocar o som nos ambientes vazios fazendo a nossa mente usar as ondas sonoras para preenchê-lo. Algumas experiências visuais lembram a sinestesia, e como talvez a melhor forma de descobrir a dilatação do tempo seja pela união intrínseca entre imagem e som.

Boca de Loba, o melhor filme da tarde, quiçá o melhor de toda a mostra se quinta feria for um dia incrível. O mundo vai acabar, o futuro será da mulher. Abolição da instituição masculina é mostrada por uma das personagens amarrando uma das várias estátuas de homens célebres de Fortaleza. Vale a pena dizer que é o mais perto que o filme chegou de mostrar um homem em 19 minutos de filme, que passou voando. Esse filme quebra barreiras cinematográficas e pessoais femininas que engloba filmar em ambientes como o centro da cidade à noite, ao mesmo tempo que brinca com o perigo de vida das atrizes e realizadoras por justamente serem mulheres dominando uma das áreas mais perigosas para ser mulher na cidade. Para sobreviver ao fim do sol que é engolido por uma mulher gorda gigante e ao centro noturno, a performance orgânica feminina do filme é a salvação das protagonistas no filme.

A Milésima Segunda Noite muito bem colocado pela curadoria na ordem de exibição parece até uma continuação de Boca de Loba. Se um retrata a destruição do mundo, esse demonstra o nascimento de uma mitologia que o próximo mundo irá se basear. Formada por mulheres negras que criam constelações, dançarinas do ventre que passam portais e vencem demônios ao passo que ainda conseguem a mocinha no final. Enquanto Presente e Mergulho dos Pássaros mostram uma experimentação muito neutra, Boca de Loba e A Milésima Segunda Noite mostram um futuro que queremos, onde mulheres negras, trans, lésbicas possam criar sua própria identidade e sua própria cultura em um mundo livre da presença masculina.

Bem diferente da visão dos próximos curtas que seriam Terra Ausente, que comenta da desolação das cidades e da histeria coletiva de uma terra árida apocalíptica. Escafandro, um oposto complementar, pois narra a história de um protagonista blindado pela mágoa que passa a ser o único numa terra que inundou. Quando o mar fecha a sessão nesse possível mundo que alagou mostrando a vivência marítima sentida por vezes pelos habitantes de cidades litorâneas. A fotografia em preto e branco e a narrativa circular efetiva um destino que sufoca na dureza de ser um ilhado numa capital envolta pelas águas.

DIA 09/08 - Pertencer a um território

Resultado de imagem para Ponte Velha, de Victor de Melo
Na última sessão da Mostra, tivemos os filmes Ponte Velha, de Victor de Melo; Tempo de Tudo, Tempo de Nada, de Ana de Sousa; Leide, de João Marcos Maia; Gênese de Cima: Uma história não escrita, de Jonathan Freitas, e Sudestino(s), de Germano de Sousa.

Ponte Velha mostra diferentes perspectivas de um mesmo local, boa pedida para começar esse recorte sobre territórios. No caso, diferentes visões da Ponte Velha de Fortaleza, que une situações corriqueiras, fotografias, performance e vídeos do youtube sobre a comunidade do Poço da Draga ocupando seu espaço. Um filme muito preocupado com a montagem de sensações dos donos do espaço litorâneo ‘dragueiro’. Esse filme possui um fio invisível com Quando ao Mar (inclusive dividindo um mesmo ator, Barba Azul) curta que encerrou a sessão de ontem (08). Será esse Olhar do Ceará o mais marítimo de todos?

Em Tempo de Tudo, Tempo de Nada, a montagem, diferente de Ponte Velha, encontra a necessidade de um requinte, mas a intenção de dividir a experiência, que é única dos moradores agricultores da serra, é tão honesta que chega a ser palpável. Simples como a vida do interior, os cortes abruptos demonstram que a vida do agricultor independente não se passa só dentro da casa onde mora, mas fora também com a terra, a chuva e a existências dos animais.

Com Leide, notamos que a relação enternecida do lugar e do indivíduo permeia esse primeiro recorte da sessão. O dia a dia simples, com pequenos tracejos e planos detalhes cheios de vida preenchem a tela. Vemos a vida de Leide, sem diálogos, contada só por suas mãos que trabalham. Aqui desviamos um pouco a atenção do local e focamos na vendedora de din-dins que hipnotiza com sua rotina gostosa e adentramos em seu território sem sermos avisados.

Os filmes anteriores criam o universo do local pelas imagens e como elas são montadas. Em Gênese de Cima é a voz de quem mora que fala do local que tentamos desvendar ‘cavucando’ o passado. Ao tentar criar esse ambiente com vários relatos, o curta mistura atmosferas muito bruscamente; uma hora retrata memórias de acontecimentos estranhos, no outro, foca em opiniões sobre o local e como é viver no interior. Um foco mais bem estruturado daria uma marca própria ao curta e não o faria ser apagado por seus predecessores.

Fechando a sessão, Sudestinos, a vida que se recorda quando se encontra num não-lugar. Um ônibus, a estrada entre estados, terminais rodoviários são esses locais que não neutros e vez sem apego, pois são passageiros. Lugares esses isentos de características são preenchidos pelas pessoas que contam suas memórias para a câmera. Contando assim, esperam mais perto da terra natal voltar. Hábito frequente de nordestinos no passado era o de sair de sua casa e ir para o sul, hoje o curta foca no movimento contrário. O filho pródigo volta, mesmo à duras penas de uma viagem de ônibus, mas com a promessa do aconchego do lar.

CURTAS VENCEDORES:

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