Pular para o conteúdo principal

Azougue Nazaré: Quando a religião desafia a cultura


Azougue Nazaré é um filme sobre Nazaré da Mata, em Pernambuco, e sobre as tradições do maracatu local. É uma ficção, com uma pegada Eduardo Coutinho, que nasce do real com atores não profissionais desempenhando personagens e vivendo dramas que poderiam ser deles fora da ficção. É bizarro de tão sincero e verdadeiro. Primeiro grande mérito já parte disso.

Tal realismo se deve ao fato de que o Brasil está passando por uma nova catequização. Há muito tempo, na verdade. E o grande conflito aqui é justamente esse. Logo no primeiro ato, descobrimos que os pastores de igrejas evangélicas estão doutrinando seguidores e, em alguns casos, impedindo-os de viver a cultura, como o maracatu, característica importantíssima da população do lugar. Com essa guerra de pensamentos e argumentos, se desenrola a obra, dirigida pelo (já talentoso) estreante Tiago Melo (produtor de Bacurau).

Azougue Nazaré: Quando a religião desafia a cultura

  CRÍTICA  


No desenvolver da trama, Melo aos poucos pontua como uma parte daquele povo se converteu à religião e passou a escutar os inúmeros ensinamentos dos pastores. Já do outro lado da guerrilha, temos moradores apaixonados por tudo que envolve a cultura da região. E, no meio dos atos, o casal Catita e Irmã Darlene surgem. Ele respira o maracatu, enquanto que ela busca ouvir o pastor do lugar.

A partir disso, o diretor mostra como a cidade se relaciona e o dia a dia daqueles que lá habitam. Com poucos minutos, estamos vivendo aquela rotina, já entendendo as características de todos os personagens. Graças aos figurinos e cenários, belíssimos, por sinal, compreendemos quem são e o que gostam de fazer, se mostrando como uma virtude do roteiro que os desenvolve pacientemente.

E quando chegamos no terceiro ato, catártico, como deveria ser, o diretor apresenta uma realidade preocupante em nossa cultura. Assim como Melo faz em seu roteiro, a ideia aqui não é julgar quem segue suas crenças e religiões. O importante é saber conviver com o que temos, sem querer matar o que pertence ao outro. Como diz Catita na conclusão da obra, ninguém pode destruir o que amamos. É o grito de desespero de todo brasileiro puto com a opressão que vem de todos os lados, até da religião, que na teoria deveria respeitar, enquanto que, em sua maioria, na prática prega o ódio.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A Morte do Demônio (2013) | Reimaginação do "Conto Demoníaco"

The Evil Dead (EUA) Em 1981, Sam Raimi conseguiu realizar algo extraordinário. Com um orçamento baixíssimo (em volta de 1,5 mil), o diretor reinventou os filmes idealizados dentro de uma cabana com jovens e demônios. Além disso, ainda conseguiu fãs por todo o planeta que apreciavam a maneira simples e assustadora que o longa fora realizado. Em 2009, Raimi entrou em contato com Fede Alvarez por seu recente curta-metragem viral que rolava pela internet. A conversa acabou resultando na id eia de uma reinvenção do “conto” original de 1981. Liberdade foi dada à Alvarez para que tomasse conta da história. Percebe-se, a início, a garra deste para uma boa adaptação, no entanto, ainda peca por alguns problemas graves percebíveis tanto para quem é ou não é fã do original. Ao que tudo indicava, seria um Reboot. Mas se trata, na realidade, de uma (aparentemente) continuação audaciosa. A audácia já começa no pôster de divulgação: “O Filme Mais Aterrorizante que Você Verá Nesta Vida”...

Anúncio Oficial [Duas Faces do Cinema: Quarto Ato]

Desde que nós dois, Arthur Gadelha e Gabriel Amora, sentamos para decidir o nome do blog de cinema que escreveríamos a partir dali, e entramos no acordo que “Duas Faces do Cinema” intitularia o projeto, já sabíamos, mesmo sem dizer um para o outro, que ele não perduraria para sempre; não como principal. No entanto, assim que lançado, ainda com um fundo preto e branco, separando o casal principal do grande vencedor do Oscar, “O Artista”, a marca “Duas Faces do Cinema” ganhava espaço entre amigos e familiares.

O Retrato de Dorian Gray | Os segredos de Dorian

Oscar Fingal O’Flahertie Wills Wilde nasceu em 1854 em Dublin, estudou na Trinity College de Dublin e, posteriormente, no Magdalen College em Oxford. Seu único romance foi O retrato de Dorian Gray e seu sucesso como dramaturgo foi efêmero. Morreu em 1900 em Paris, três anos após ter sido libertado da prisão por ter sido pego em flagrante indecência.  O retrato de Dorian Gray foi publicado pela primeira vez em 1891 em formato de livro em uma versão bastante modificada do romance original de Oscar Wilde, pois foi considerado muito ousado para sua época. Já tinha sido editado quando publicado em série na revista literária Lippincott’s em 1890 e depois ainda foi alterado pelo próprio Wilde, que em resposta às duras críticas, fez sua própria edição para a publicação em livro. Estamos falando de uma Inglaterra do século XIX bastante tradicionalista e preconceituosa, assim, a versão original, tirada do manuscrito de Wilde, nunca havia vindo a público. Nicholas Frankel, professor de I...