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Camaleoa, uma artista cearense entre a música, teatro e cinema

Foi quando começou a tocar violão e a criar intimidade com o instrumento, aos 17 anos, que a cantora Camaleoa começou a expressar seus sentimentos e retratar suas vivências de forma despretensiosa criando músicas. Hoje, aos 22 anos, a jovem, porém madura, a artista reúne dez de suas canções em seu primeiro disco, intitulado de forma homônima “Camaleoa”, já disponível em todas as plataformas de música digital.

Camaleoa: uma artista cearense entre a música, teatro e cinema

Para o Quarto Ato, Camaleoa conta de surgiu sua vontade de se vestir de pop. Confira a entrevista.


Com um nome que reflete a personalidade mutável da artista, o disco é um registro íntimo, pessoal e verdadeiro sobre as delícias e as dores (enfrentadas com muito amor próprio, força e poder) de ser mulher e a capacidade de se adaptar e mudar como as situações exigem. É complementado por uma produção audiovisual de cerca de oito minutos que ilustra as músicas, sendo a primeira artista a lançar um álbum-filme em Fortaleza. Para o Quarto Ato, Camaleoa conta de surgiu sua vontade de se se vestir de pop. Confira a entrevista logo após seu filme de estreia.

 

Por que "Camaleoa"?

Bom, quando eu compus Camaleoa em torno de 2016, eu falava na música justamente sobre uma pessoa que tem que aprender a se adaptar durante a vida, uma pessoa em constante metamorfose. É assim que eu me identifico e eu acabei compondo Camaleoa em pouco tempo, apenas colocando pra fora traços da minha personalidade. A música acabou gerando um retorno incrível da parte do público, eles começaram a me chamar assim, de forma bem natural... E eu comecei a sentir que esse nome me representava muito e não só eu achava, já que as pessoas também sentiam essa conexão. Ele inicialmente era apenas a representação do single do CD e depois se tornou meu nome artístico, dando um outro significado pro nome do CD, que deixava de ser ligado ao nome de uma música e passava a ser meu nome de trabalho.  Eu, como uma pessoa que trabalha em um mundo em constante mudanças como a indústria fonográfica, não poderia ter outro nome.

O que você acredita que esse álbum apresenta? Seus princípios, o seu mundo ou apenas uma parte de você?

Meu álbum representa minha vida, ele é bem íntimo, eu não nego isso pra ninguém. Só consigo compor sobre o que eu entendo. Tanto que é um material naturalmente feminino, pois eu expresso muito sobre minhas vivências sendo uma mulher e isso acaba gerando familiaridade com outras mulheres, também. Ele tem um pouquinho de tudo, ele fala sobre minhas vivências, ele fala um pouco sobre minhas críticas em relação a sociedade. Ele é o meu local de fala de forma bem direta, sem medos, sem receios. Eu usei meu material pra expor tudo que eu sentia que era necessário.

Há uma unicidade no seu álbum-filme que deixa em estado de alerta: ele não é um simples conjunto de imagens sobre sua música. É uma peça à parte, com mensagem, sonoridade e estética própria, caminhando entre a performance e o video-arte. De onde veio essa ideia de criar um filme para apresentar uma Camaleoa que é um conceito tanto sonoro, quanto audiovisual?

Eu passei muitos anos dentro de studio tentando finalizar meu CD, outra coisa que eu tento deixar bem claro, é sobre a dificuldade de um artista independente no momento de criar seu material. Eu sentia que meu CD já falava muito por si só, ele tem letras fortes, ele tem uma narrativa coerente. Você escuta e entende uma linha do tempo de faixa pra faixa. Mas eu queria que isso fosse visível aos olhos também. E eu queria fazer algo que ainda não tinha sido feito aqui, principalmente. Então eu pensei: Por que não fazer um curta metragem? E isso tudo foi no fim do ano passado, logo após lançar meu primeiro videoclipe de "Um Mais Um." Não foi nada complicado criar o roteiro, porque como eu disse, tudo desse CD é ligado a minha vida. Então tudo que eu coloquei no roteiro faz parte das minhas crenças, eram coisas que eu já tinha em mente e só faltava a oportunidade de colocar em prática.

Além da composição das músicas, como foi assumir o roteiro desse filme? Estender as ideias das faixas à diferentes momentos num filme, evocar outras sensações. Como foi? Você teve alguma preparação em cinema?

Na verdade foi uma coisa que eu trabalhei em mim aos pouquinhos. Eu gosto muito de teatro, mas nunca fiz. E é algo que eu quero mudar a partir de agora, pois recebi feedbacks positivos sobre o filme e acho que vale a pena explorar esse lado ainda mais pra um futuro próximo. Dirigir e criar o roteiro do meu próprio material foi algo que eu fiz por conta da falta de orçamento pra ter uma equipe, de começo. E depois me vi completamente apaixonada por produção. Acho que posso dizer que criar roteiros é algo que eu realmente queria manter daqui pra frente e não só pra mim, sabe? Eu imagino isso de forma literal. Foi um processo muito lindo, porque no momento em que eu escrevia cada momento do roteiro, eu conseguia visualizar tudo e quando ficou pronto, eu só conseguia pensar em como eu tinha conseguido provar pra mim mesma muitas coisas com esse material. Eu usei esse material pra me desafiar e eu gostei muito do que ele me ajudou a fortalecer e perceber o que também pode ser fortalecido de agora em diante.

Sua arte se posiciona socialmente e politicamente em temas como feminismo, sexualidade e religião. Como você enxerga o cenário brasileiro, com o preconceito tão exposto? Qual a importância de artistas como você, que abordam esses assuntos?

Esse meu trabalho pega em um ponto delicado que envolve religião, acho que foi isso que ele trouxe de diferente. Uma coisa que eu tinha receio era sobre a falta de interpretação na filmagem, até o momento, isso não aconteceu. Mas o material ainda tem muitas pessoas pra alcançar. Eu queria falar sobre tudo que eu creio ser certo e errado, como cada um tem sua própria visão de mundo, eu queria mostrar a minha. Com a diferença que a minha é um curta metragem de 8 minutos, isso torna tudo mais delicado. Falar sobre sexualidade feminina, sobre orientação sexual, sobre intolerância religiosa e sobre principalmente religiões diferentes, era meu intuito. E eu acho que consegui alcançar sem ofender ninguém mas fazendo refletir. O cenário brasileiro tem inúmeros artistas com posicionamento através da arte e eu me inspiro neles pra manter meu posicionamento firme e forte.

Sua arte surge num momento muito digital para o consumo de música no Brasil e o no mundo. Hoje não é preciso aparecer na TV para ter público. Como é isso para você? Ser parte já de uma nova era cultural?

A era digital faz parte da minha vida, sem ela eu nem teria hoje em dia lançado um CD. Já que eu comecei lançando uma música no YouTube e essa música me gerou oportunidades e confiança. E se a internet não tivesse essa força que ela tem, isso não teria acontecido. Nem teria acontecido com tantos amigos meus que vem sendo valorizados aqui na cidade, com a força que o mundo digital nos oferece. Eu sou muito sortuda de ter nascido em uma época onde apesar das dificuldades, as coisas são muito mais simples pra quem como eu, se auto-produz.

Os artistas pop que surgem hoje em dia geralmente lançam singles ou EPs de estreia, para só depois lançarem um álbum completo, até por conta dos custos. Mas você lançou um CD e um filme, com conceito bem definido. Você não teve medo de arriscar? Como foi esse processo?

Durante o processo do CD, eu admito que recebi inúmeras dicas sobre não lançar o CD todo. Focar em singles... E eu até pensei em desistir do projeto do CD e partir pra singles. Mas eu faria isso em nome do que as pessoas julgam ser o "material ideal" pra acontecer. E eu não queria perder a chance de me realizar, por conta disso. Eu tinha esse sonho e eu queria manter, porque só eu sei o quanto eu tinha batalhado por ele. Não vou mentir que ele foi muito complicado e que eu não estava preparada pro trabalho que um material desse tamanho daria. Eu tinha acabado de entrar na música, quando decidi que queria ter um CD e comecei a colocar isso em prática. Mas eu me sinto completamente realizada, agora. Eu aprendi algumas lições, claro. Mas foi necessário também focar em que tipo de arte eu queria fazer. Se eu queria a comercial demais que me deixaria sempre presa a um único tipo de lançamento, a único tipo de linguagem ou se eu queria desde já começar mostrando que eu quero ser livre com a forma que eu quero me expressar com meu trabalho. E que não existe fórmula certa e errada no mundo da música hoje em dia, é tudo sobre fazer com a alma. E se você fizer isso, tudo vai ser lucro.

Faz mais de um mês que o filme e álbum foram lançados. Como está sendo a repercussão?

O filme teve uma repercussão que eu não imaginava. Ele vem atingindo um público fora do meu ciclo, coisa que eu imaginava que acontecesse, mas não tão rápido. Pessoas que eu considerava que fossem se sentir ofendidas com as mensagens, vieram até mim dizer o quanto foi impactante, dando força, elogiando a qualidade. É gratificante! Porque eu tinha sim receio de como ele seria recebido, apesar de que eu preferi arriscar com o tudo ou nada. Mas eu jamais imaginei que as mensagens seriam assim tão aconchegantes.

Já que o pop não é o gênero mais popular no Ceará, qual o maior desafio de se reconhecer uma artista pop na terra do forró? Como esse Ceará também pode te influenciar?

A nossa cidade vem se abrindo pra novos gêneros já tem um tempo. A cena local tem artistas de inúmeros seguimentos e tem público pra todos, apesar do forró ainda ser o gênero de maior popularidade, as portas vem se abrindo pra novos. O pop é um gênero que eu atuo desde 2016 e desde lá ele vem crescendo, vem se fortalecendo e se tornando tema de várias festas locais. Isso é muito lindo de assistir. Porque é um gênero que vem crescendo no país como um todo, a nossa cidade vem abraçando isso, também. Meu Ceará sempre vai ser uma influência enorme em questão de musicalidade. A gente escuta forró desde pequeno e o forró ajudou sim a forma boa parte do meu gosto musical e eu digo isso pra todo mundo! Tenho orgulho de morar em Fortaleza e ter a bagagem musical que só ela poderia ter me oferecido.

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